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Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

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Uma pergunta é suficiente

Por vezes, uma pergunta é suficiente. Não é preciso acrescentar mais nada. Uma pergunta diz muito sobre o calibre intelectual do interpelador e é capaz de esboçar um retrato pormenorizado do mesmo.

 

Hoje o noticiário das nove da manhã da SIC Notícias abriu com uma entrevista a um representante sindical dos trabalhadores da Autoeuropa, em Palmela. No decorrer da entrevista, o jornalista, de seu nome Joaquim Franco, fez a seguinte pergunta:

 

“E entende que é possível manter a produção que se pretende (...) deste novo modelo com essas restrições que vocês querem impor ao alargamento dos turnos?”

 

Recorde-se que os trabalhadores da Autoeuropa estão em luta contra o facto da empresa querer impor-lhes trabalho aos sábados sem que seja pago como trabalho extraordinário, mas para Joaquim Franco são os trabalhadores — “vocês” — que querem impor restrições à Autoeuropa. Mais, Joaquim Franco considera importante, neste contexto, questionar o representante sindical sobre a viabilidade da produção da empresa, induzindo o ouvinte no sentido de que essa viabilidade está a ser posta em causa com a ação dos trabalhadores.

 

Se esta pergunta já dizia tudo o que era preciso dizer sobre a mediocridade intelectual do indivíduo, ao qual se aconselha vivamente que leia mais, muito mais, sobre os movimentos sociais de finais do século passado que, entre outras coisas, lhe permitem fazer as perguntas imbecis que hoje faz de microfone na mão, a verdade é que esta pergunta também é reveladora da cândida “imparcialidade” com que é revestida boa parte da mui nobre comunidade jornalística portuguesa.

 

Uma nota para salientar algo que merece ser salientado. Esta situação que aflige os trabalhadores da Autoeuropa é o corolário esperado das ações de um movimento sindical muito elogiado por toda a sociedade — patronato incluído —, uma comissão de trabalhadores moderna e virada para o futuro, cujo líder inicial, entretanto reformado, até se tornou num símbolo pop da nova esquerda, para a qual a luta de classes é um conceito ultrapassado. Refiro-me a António Chora e ao Bloco de Esquerda, como é evidente. Convém que coloquemos os nomes nas pessoas e nos partidos para que se saiba a quem é devida a responsabilidade das coisas.

 

De acordo em acordo, de cedência em cedência, muitas vezes a troco de umas efémeras esmolas, este movimento sindical foi permitindo ativamente que um quadro de direitos laborais minimais fosse instituído naquela empresa e a situação foi perdurando até recentemente quando os trabalhadores se uniram e disseram basta! Os trabalhadores sentiram que não podiam continuar mais a ceder, vergados a ameaças constantes de encerramento e deslocalização e à ladainha vazia e hipócrita do costume por parte da empresa e que faz parte da cartilha que é sempre recitada pela burguesia nestas ocasiões. Parabéns aos trabalhadores da Autoeuropa pela sua coragem. Perderam, todavia, muito tempo. Sobre isto o Bloco de Esquerda não diz uma palavra. António Chora também não. A estes, nem uma pergunta. Passam pelos eventos como que saltitando por entre os pingos da chuva. António Chora nunca foi alguém verdadeiramente importante. Foi simplesmente alguém a quem o capital recorreu para levar os seus interesses avante. A burguesia tem inúmeros recursos para minar e dividir a luta dos trabalhadores. Chora foi apenas mais um.

publicado às 12:20

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