Tempos obscuros. Tempos rudes.
Vivem-se tempos obscuros, obscuros pela sua rudeza, no que à vida política diz respeito. O debate político não consiste mais numa manifestação clara de intenções e numa disputa de argumentos lógicos e fundamentados. O jogo político transformou-se, degenerou-se, num exercício medonho de dialética com interseção vazia com as esferas da racionalidade e da lógica e recorrendo repetidamente ao insulto mais primário.
O mais recente episódio dos contratos de associação é um bom exemplo disto mesmo. A direita política consegue defender o indefensável no que a este caso particular corresponde. E o indefensável consegue, imagine-se, produzir sonoro eco na generalidade dos meios de comunicação, como que adquirindo deste modo a credibilidade que deve, por defeito de criação, à argumentação lógica, aos princípios e ao bom senso. Por sua vez, o Governo chega ao embaraçoso ponto de ter que defender a racionalidade e a objetividade das suas medidas.
Com efeito, requer-se que o Governo explique com minúcia porque quer deixar de pagar em duplicado no que concerne ao orçamento da educação, ao mesmo tempo que enfrenta uma série de factos insofismáveis: que as escolas privadas são muito melhores do que as escolas públicas, que as escolas privadas são o garante da liberdade de escolha e que é proibido receber e falar com os sindicatos. Fazendo uma resenha da argumentação da direita obtemos este lixo. E com este lixo que somos obrigados a lidar todos os dias enquanto esta febre dos contratos de associação durar.
Ao que parece, este estado de demência que assola o debate político, e que, em boa verdade, nada mais não é do que o reflexo de um processo de radicalização da direita política, veio para ficar. Oxalá que não seja mais do que isto. Oxalá que estes tempos obscuros, estes tempos rudes, não sejam pois assim como um prelúdio para uma viragem política de contornos sinistros. Uma viragem como aquela que o nosso país viveu, em circunstâncias não tão distintas como as que experimentamos hoje, no final da Primeira República.