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Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

A quem é que o estado serve?

A inflação tem, seguramente, diversos efeitos nefastos numa economia, efeitos que conduzem à disrupção de padrões de consumo e de circulação do capital, tornando a economia mais receosa e conservadora e acelerando a sua perigosa tendência natural em capitalismo: a acumulação de riqueza.

Para o estado português, todavia, a inflação traz consigo um potencial inesperado, que o mesmo espreme até que as massas se comecem a contorcer e a retorcer de insuportáveis dores. O país com uma das mais elevadas cargas fiscais da Europa aguenta até ao último segundo para baixar umas décimas de impostos, aproveitando, nos “entretantos”, todo esse imoral excesso de tributação. Depois, o estado ainda se vangloria, na cara do povo proletário, como se lhe estivesse a fazer um grande favor! Prática consolidada, em décadas, com os combustíveis, estende-se agora à generalidade dos produtos, em média, 8% mais caros. Se queremos estabilidade, temo-la no IVA que “resiste”, sólido, determinado, nos 23%.

O povo devia saber onde está a ser aplicado este excesso brutal e, reforço, imoral de tributação. Se assim fosse, algumas coisas tornar-se-iam mais claras. Por exemplo, para que é que o estado serve e a quem é que o estado serve. Não tenhamos ilusões, todavia. Com a segurança social passa-se a mesmíssima coisa. Dada a mortalidade extraordinária que, infelizmente, tem afetado sobretudo reformados e pensionistas, uma pergunta fundamental emerge: a segurança social está rica? E, se não está, para onde está a ir o dinheiro? É que nem a idade da reforma baixa de forma significativa! Voltamos ao princípio: se isto nos fosse explicado, perceberíamos claramente para que é que o estado serve e a quem é que o estado serve. E, então, as coisas poderiam diferentes.

publicado às 11:18

O ascendente da ética sobre a moral nas sociedades contemporâneas

A ascensão das sociedades mais laicas em substituição daquelas de inspiração mais religiosa, mesmo que apenas consubstanciadas numa prática corrente e não na letra formal das constituições, teve inúmeras vantagens, quebrou decisivamente correntes que nos prendiam a um certo obscurantismo medieval, permitiu um sem fim de progressos sociais e científicos, mas também teve, observando a evolução antropológica das sociedades, o seu quinhão de consequências negativas.

 

Com efeito, esta progressiva transformação trouxe consigo uma perspetiva diferente sobre o Homem que deixou de ser visto como um mero subordinado aos ditames de Deus, mas antes como um ser individual e livre para gizar a sua vida, a escolher os seus princípios orientadores, os seus valores e os seus representantes na disputa política pública. Se Deus foi saindo paulatinamente da equação à medida que o Homem foi tomando o seu lugar no centro da existência, aqueles valores imutáveis e inquestionáveis com que este aprendia a viver desde o berço, e independentemente do seu berço, foram também sendo substituídos por princípios discutidos e negociados coletivamente, constantemente aferidos, corrigidos e reformulados. A moral, a moral religiosa, que vigorava de modo mais ou menos imutável, deu, pois, o seu lugar à ética, isto é, aquela disciplina que questiona e discute os princípios da moralidade.

 

Se pode ser verdade que, em muitas situações, que até podemos arriscar chamar, se assim o entendermos, de maioritárias, ética e moral mais não são que palavras sinónimas, também é verdade que aquela diferença fundamental entre elas tem o potencial de germinar numa sociedade mudanças dramáticas na forma como as pessoas entendem os seus valores e interagem entre si. Sublinhemos bem essa diferença primordial.

 

Daquela discussão aflorada acima, na qual a ética coloca em evidência os princípios morais de natureza cultural e histórica, colocando-os em causa, surge um conjunto de princípios discutidos, negociados e aceites por todos, consciente ou inconscientemente, com o objetivo declarado de melhorar a vida coletiva e aprimorar a convivência nas sociedades. Repare-se como a ética discute e altera os princípios, articula-os, colocando-os ao serviço de um certo pragmatismo social que é legítimo, sublinhe-se. Neste sentido, existe uma sujeição, na prática, dos princípios éticos à audiência que observa e avalia. Seguimos determinado princípio porque parece mal não o fazer. Não desrespeitamos a fila do supermercado porque os outros vão reclamar. Sobra sempre, todavia, uma réstia de pensamento que nos faz pensar sobre se adotaríamos o mesmo comportamento se ninguém nos visse ou se, por absurdo, dispuséssemos do dom da invisibilidade.

 

A moral é algo mais profundo, mais imutável. São aqueles princípios que temos connosco próprios. Sim, são ensinados, são aprendidos, não nascem connosco, nem estão inscritos no nosso código genético. Mas são princípios que vivem connosco, que tomamos como nossos, que entendemos como fundamentais independentemente de estar alguém a ver ou não. Respeitamos os nossos princípios morais sempre e em qualquer circunstância. Não roubamos, nem fazemos mal a alguém independentemente de alguém poder estar a observar os nossos atos.

 

É sempre possível argumentar que, hoje em dia, princípios morais, desta natureza implacável, são raros ou inexistentes. É verdade. Mas isso só coloca em evidência a decadência moral das sociedades, destas sociedades que julgam que tudo é passível de ser discutido ou negociado, onde não existem alicerces (morais) nos quais se possa confiar cegamente e em qualquer circunstância.

 

É preciso religião para haver moral? Claro que não. É preciso haver, sim, mais família, mais tempo de família para se passar valores aos filhos, mais acompanhamento dos mais jovens e menos tempo dedicado à empresa, ao trabalho e aos negócios, menos tempo de depósito da juventude em creches, jardins de infância e até escolas, e também menos entretenimento intelectualmente decadente, já agora. É preciso outras prioridades coletivas, no fundo. Não se pode ter tudo, não é assim? Alguns valores não são compatíveis por muito que queiramos que sejam.

publicado às 15:00

Quino. O artista. O homem. A sociedade.

https://ogimg.infoglobo.com.br/in/24669928-497-e5c/FT1086A/652/x89840992_Lucca-1984-Argentinian-cartoonist-Quino-carrying-an-outline-oh-his-character-MafaldaLucc.jpg.pagespeed.ic.gedC7xlDxG.jpg

image: ogimg.infoglobo.com.br

 

A morte dos grandes artistas suscita-me inevitavelmente sentimentos de grande perplexidade perante as grosseiras incongruências do mundo. Ontem, a notícia da morte de Quino, o genial cartoonista criador da Mafalda, foi mais um pretexto para hoje eu acordar em plena convulsão interna.

 

Em primeiro lugar, importa que percebamos o que é que concedeu a Quino a sua propriedade de genial, como referi. Frequentemente, temos tendência a associar o genial ao domínio da técnica, à inovação, à novidade, sobretudo na era contemporânea, fortemente marcada pelo marketing, pela publicidade e pela propaganda. Mas serão mesmo estas as condições para a genialidade? No caso em questão, horas após o falecimento de Quino, terão sido estas as características que fizeram dele um génio intemporal? Eu acho que não.

 

É um facto que Quino dominava genialmente a técnica e também terá sido um inovador no seu tempo, disto não poderei opinar com propriedade pois não sei o suficiente sobre a área, mas admito que sim, dou isso de barato. Mas o que fez da Mafalda o símbolo que ainda hoje é, um símbolo da liberdade, da igualdade, da paz, do movimento feminista, não foi nada de natureza técnica ou publicitária: foi a mensagem veiculada que era própria, que era autêntica e genuína. O elemento diferenciador, o passaporte para a eternidade, é a mensagem.

 

As perguntas que Mafalda fazia em meados dos anos sessenta continuam igualmente válidas hoje em dia. Permanecem quase que imutáveis, como se a evolução do mundo não lhes conseguisse dar resposta. Em entrevista, Quino costumava dizer que quando começou a desenhar tinha a esperança de conseguir mudar o mundo. Lamentavelmente, o mundo mudou, mas para pior.

 

Em segundo lugar, algo que estou sempre a sublinhar quando um génio desta estirpe nos deixa, é a comoção mediática generalizada, a elevação do homem a uma espécie de estádio superior, ao qual justamente deve pertencer, pelo alcance da obra feita em vida. Não consigo de deixar de apontar o dedo à imensa hipocrisia que inunda a comunicação social e a sociedade, uma hipocrisia que permite, em simultâneo, elogiar a pessoa e a obra e continuar a alimentar as lógicas de uma sociedade cada vez mais desigual, cada vez mais injusta e exploradora. É difícil de entender como é possível alinhar neste jogo duplo e, nestes momentos, é quase como o assumir de uma contradição gritante entre os princípios assumidos e escolhidos para se viver a vida e os princípios desejáveis da moralidade ou da ética.

 

Quino morreu. Celebramos a sua vida, mas a vida que levamos e vamos construindo coletivamente é contraditória com o seu legado.

publicado às 09:07

A filosofia da sociedade utilitarista

Passei há instantes por um cartaz do Bloco de Esquerda — os cartazes do Bloco têm sempre a faculdade de me perturbar intelectualmente — que, em maiúsculas carregadas, dizia: “não há planeta B”.

 

Passemos ao lado da descarada e oportunista usurpação do slogan desta “geração ambiente” por parte do Bloco de Esquerda, esta juventude mundial que anda muito indignada com as questões do meio ambiente, todavia aparentemente insciente do facto de que, ela própria, ao ritmo de um iphone novo, e afins, por ano, consome mais plástico que todas as outras gerações antecedentes à sua todas somadas. Passemos ao lado disto.

 

Coloquemos no centro da discussão a frase “não há planeta B”. Parece que existe a intenção, por parte do Bloco e da juventude que faz uso deste argumento, de apelar a uma mudança de hábitos e mentalidades com respeito ao meio ambiente. O silogismo em causa será mais ou menos este: estamos a destruir o único planeta de que dispomos para habitar e, por conseguinte, tendo plena consciência de que não existe alternativa, devemos alterar, isto é, inverter, a situação.

 

A pergunta que coloco é: e se houvesse alternativa?

 

E se, amanhã mesmo, encontrássemos uma segunda Terra, num outro sistema solar, com todas as condições para replicarmos à sua superfície as vidas que aqui levamos?

 

Existindo planeta B, seria, então, correto prosseguir a destruição deste “planeta A”?

 

Claro que não e, por isso mesmo, o argumento “não há planeta B” é vazio e não faz qualquer tipo de sentido.

 

Bem sei que estou para aqui a esmiuçar a coisa ao limite e que nada disto passará pela cabeça de quem faz uso da catch phrase “não há planeta B”, mas este tipo de slogan é simbólico, pois traduz uma forma de pensar, uma forma de argumentar e de estruturação lógica do raciocínio, uma forma de distinguir o que é correto do que é incorreto e, em última análise, traduz o modo como a própria sociedade interpreta o que é lícito ou ilícito do ponto de vista da lei.

 

Chamei-lhe a filosofia da sociedade utilitarista porque se trata disso mesmo. A utilização do argumento “não há planeta B” só fará sentido numa sociedade utilitarista, isto é, uma sociedade que justifica os meios através dos seus fins pretendidos, em que as atitudes devem ser valoradas em função dos proveitos que delas advenham e não pelo que elas próprias representam ou constituem.

 

Devemos cuidar do nosso planeta porque não há um planeta B? Não. Devemos cuidar do nosso planeta porque isso é o que é correto do ponto de vista dos princípios e da moralidade. Devemos cuidar do nosso planeta do mesmo modo que cuidamos do nosso jardim ou da nossa casa. Devemos cuidar de todos os animais e plantas do mesmo modo que cuidamos dos nossos filhos. E não porque isto ou porque aquilo. Não por causa desta ou daquela consequência.

 

Mas esta é exatamente a forma de pensar desta sociedade despida de qualquer vestígio de princípios éticos ou morais, governada por uma pseudo ciência do “ver pra crer”, que imprime nas mentes a desconfiança por qualquer princípio moral a priori.

 

Falava noutro dia com um professor que, indignado, me contava como um aluno lhe disse que só o respeitava se ele o respeitasse a ele. Reparem bem nos princípios de base que estão aqui em causa: o aluno não respeita o professor porque sim; o aluno respeita o professor se isso lhe convier. Cada um de nós reconhece a situação que descrevo e, inclusivamente, uma grande parte identifica-se com este modo de pensar. Trata-se dos alicerces da sociedade utilitarista, consequência da proposta de sociedade de consumo que nos é promovida pelo capitalismo.

 

Como pode um argumento saído deste quadro lógico-moral ser capaz de transformar o próprio sistema de que é originário?

publicado às 13:35

Consequências lógicas do sistema

As pessoas não entendem que isto não é por mais esta ou aquela lei, não é por mais polícia na rua, por mais guichets de serviços, pessoal a atender ou papéis para preencher. O que está mal é o sistema. O que está errado é esta filosofia que preside às sociedades humanas e que nos está tão entranhada desde o momento em que vemos a luz do dia e que somos formatados para sermos peões sobre este tabuleiro de xadrez.

 

As pessoas não percebem isto. Porque a lei não existe para sermos tratados por igual. Porque a polícia não existe para nos proteger por igual. Porque os serviços não existem para sermos servidos por igual. Porque os papéis não servem uma organização social que nos trata por igual. A lei, a polícia, os serviços e os papéis servem para proteger o dinheiro e quem o tem. Este é o seu singular propósito.

 

O problema está no sistema, na filosofia, no capitalismo. Nunca nos poderemos tornar melhores sob um sistema que nos trata como cães em disputa constante por uma mesma côdea de pão. Tudo o que vamos assistindo — crime, corrupção, injustiça, iniquidade — são meras consequências lógicas, expectáveis, do sistema.

 

As pessoas não entendem isto. É difícil de entender.

 

Mude-se o sistema, destrua-se o capitalismo e, então, poderemos ambicionar atingir um outro nível mais equilibrado, mais justo, mais democrático, moralmente mais elevado, mais avançado.

publicado às 12:14

Bilhar chinês

Tal como já havia aqui mesmo vaticinado, algures neste blog, a TAP acabou por ser despachada como se de uma bagatela se tratasse. Observe-se que a palavra “bagatela” é aqui empregue na sua mais justa aceção. Com efeito e para que conste, no dicionário online da priberam vem: objeto de pouco valor; coisa sem importância; frivolidade, ninharia; o mesmo que bilhar chinês.

 

Há quem diga que os dez milhões não chegam para comprar um avião comercial. Pela minha parte, até podiam chegar para comprar dois ou três. Não percebo de compra e venda de aviões. O meu entendimento fica-se pelas questões da verticalidade, do caráter e, até mesmo e porque não dizê-lo, da moralidade da coisa. No dia seis de novembro de dois mil e seis esta mesma TAP adquiriu a Portugalia, uma companhia bastante mais pequena, pela módica quantia de cento e quarenta milhões de euros, catorze vezes mais do que o preço por que hoje é vendida. Por isso, para mim tudo isto é bastante claro: ou os administradores da TAP em dois mil e seis, bem como todos os responsáveis políticos de então, vão para a cadeia por uma exorbitante e injustificada compra e consequente gestão danosa, ou vão os de dois mil e quinze por uma venda a preço vergonhosamente simbólico, escandalosamente baixo e, portanto, gestão criminosa da coisa pública. Das duas uma. Ou somos um país decente e alguém vai para a cadeia, ou não somos.

 

O que se pensaria se uma empresa têxtil fosse vendida pelo preço de uma máquina de costura? Ou uma empresa de transportes rodoviários pelo preço de uma camioneta? Mas raciocinar segundo esta lógica significa que já caímos na armadilha do capitalismo: significa que para nós tudo tem um preço e que apenas subsiste a elementar tarefa de procurar um justo valor de venda. Não é verdade. Tudo isto é surreal. No mundo do Homem evoluído, do Homem solidário, do Homem da fraternidade e dos afetos que sabe que apenas pode evoluir com o seu vizinho e não contra ele, nesse mundo poucas são as coisas com uma etiqueta de preço agarrada. Não há um preço, há um valor. E o valor da TAP é imenso para o português ainda que este possa não o saber. Seguramente, porém, aprenderá o seu valor algum dia quando as companhias aéreas, todas privatizadas, conjugarem os seus interesses à frente dos nossos.

 

Das tristes declarações do nosso presidente da república, que se diz muito aliviado com esta dádiva que foi a privatização da TAP, nem uma palavra. Não constituem sequer objeto de admiração. Apenas sugerem pena. Ou o contraponto adequado a este bilhar chinês em que se tornou o desgoverno de Portugal.

publicado às 17:09

Se o abstrato fosse concreto: um exercício ficcional

Se este governo fosse uma pessoa, se tivesse braços e pernas e uma cara que pudéssemos ver, olhar nos olhos a cada atitude sua, seria seguramente alguém a quem me recusaria cumprimentar.

 

Seria uma pessoa mesquinha, sem vestígio algum de caráter, de espinha dorsal, alguém sem respeito ou consideração por quem quer que fosse com a exceção dos seus patrões, como fiel lacaio que seria. Forte com os mais fracos e fraco com os mais fortes. Sem respeito inclusivamente pela lei procurando forçar a sua vontade contra tribunais constitucionais ou meramente civis, recurso após recurso, chumbo após chumbo, advertência após advertência. Como que se julgando superior aos demais.

 

Seria uma pessoa que me revoltaria as entranhas a cada encontro ocasional. Com aquele ar petulante com que se apresenta após cada malfeitoria, aquele esgar hipócrita de quem procura fingir ser extremamente sério. Seria uma pessoa de escassa cultura, sem saber estar, sem saber viver, de boçais modos, de sorriso mentiroso.

 

E seria mais: seria o típico vizinho invejoso, ativo no seu desejo de rebaixar os seus pares ao seu próprio nível, ao invés de procurar, com eles, crescer também. Se os governos fossem pessoas, se os países fossem pessoas, como Portugal, como a Espanha, como a Grécia... que triste cena seria esta... Como poderiam certos governos, como pessoas que seriam, olhar-se ao espelho a cada manhã depois do que tentaram fazer nas costas dos outros em seu prejuízo?

 

Mas este governo não é uma pessoa. É uma entidade abstrata sem braços ou pernas, sem cara ou olhos. Quanto muito, são muitos milhares de pessoas. Ou essas pessoas, em geral, admitem que uma entidade abstrata faça aquilo que, por outro lado, consideram moralmente reprovável a um indivíduo de facto, ou então sou eu que não faço parte, que não me enquadro. São os meus valores que estão ultrapassados.

publicado às 11:50

Quadra de moralidade

Quando era mais novo, muito novo, quando não fazia ideia sequer das consequências dos atos, nem ponderava sobre as causas dos mesmos, quando pensava que todo o universo se movia em torno do meu ego, houve uma lista de valores, de princípios, que me foram impingidos, sem uma qualquer ordem natural. Eram valores que se considerava importantes e estruturantes daquilo que eu poderia ser e que, sob uma certa perspetiva de desenvolvimento, germinaram naquilo que hoje constitui o meu quadro moral.

 

Detesto a palavra moralidade. Detesto-a por estar tão umbilicalmente relacionada com as forças mais retrógradas das sociedades humanas e porque, ultimamente, serve sempre de pretexto para os poderosos enraizarem e perpetuarem o seu jugo sobre os mais fracos.

 

Por isso, esta moralidade de que falo nada tem que ver com aquela que se aprende nas catequeses. São os valores dos homens que existiam muito antes das religiões e dos deuses nascerem. São os princípios dos homens que trabalham e que juntos sobrevivem o dia-a-dia e que amam e se respeitam como irmãos e não como concorrentes. Em última análise, foi essa particularidade das sociedades primitivas humanas que permitiu ao Homem deixar os demais animais para trás na escada evolutiva.

 

Neste contexto e no contexto da presente quadra natalícia, independentemente do seu significado religioso, queria apontar o seguinte. Um dos valores que me foi transmitido foi que aquele que ajuda não se deve regozijar por isso. Ninguém deve saber. Não deve tomar crédito da ajuda que deu, nem tão pouco adquirir qualquer tipo de vantagem pelo que fez, pois não é por isso que o deve fazer. E contudo...

 

Hoje não há uma grande superfície, não há um tentáculo capitalista, que não tenha a sua pequena ação caridosa ou campanha solidária, às vezes até mais do que uma, ao sabor do bom espírito natalício. Não existe um que seja. Nunca vi tal igual. E anunciam-no aos sete ventos! Anunciam-no para que acorramos a comprar nos seus estabelecimentos transbordando de piedade ou do que quer que seja.

 

Ninguém impede que essas lojas e lojinhas façam os seus donativos que, aliás, devem fazer, mas usar a solidariedade como slogan publicitário é demasiado baixo. Tão baixo que me surpreende que aceitemos isto como natural. Surpreende-me que se permita isto. Estará o Homem do século XXI tão afastado assim do seu antepassado ancestral? Por ventura, tratar-se-á de um tipo contemporâneo de moralidade oportunamente disseminado nesta quadra.

publicado às 19:21

Catalunha livre

Gostava de ver uma Catalunha independente. Independente, como aquele povo merece e como sempre devia de ter sido, por muitos anos que tenham passado e por muitos mais que possam vir a passar.

 

Não me esqueço de que Portugal deve a restauração da sua independência, em parte, à Catalunha. Devemos-lhes isso. Não fosse a revolta que deu na Guerra da Catalunha de 1640 a 1652 e o nosso próprio golpe revolucionário de 1640 poderia não ter resultado em coisa nenhuma. Por isso, repito: devemos-lhes isso, porque tenho memória histórica e porque amo o meu país. É triste que ao mais alto nível não subsistam estas qualidades. Porque, caso contrário, os mais altos representantes da nação assumiriam o seu dever moral e patriótico de apoiar a causa catalã.

 

Gostava de ver uma Catalunha independente como é o seu direito. Mas gostava também que o caminho livre e independente que o povo catalão há de um dia tomar nas suas próprias mãos fosse um caminho de progresso social e humano e que a Catalunha livre de Castela se erguesse como um farol de liberdade. Um farol para iluminar a europa e o mundo neste século XXI. De países conservadores e repressores já estamos bem servidos.

publicado às 23:27

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