Inevitabilidade ignorante
Existe uma ideia generalizada e persistente de inevitabilidade que paira sobre as sociedades como nevoeiro denso e espesso. Uma ideia angustiante que queda as populações amorfas e inertes. Uma ideia de impossibilidade, de predeterminação e de resignação. Essa ideia falsa, explicarei porquê, advém de uma de duas situações: comodidade de pensamento ou ignorância estrutural. Centremo-nos na segunda. Muitas pessoas ignoram a história do mundo, a sua própria história. Ignoram abusivamente pois caso contrário perceberiam que não existe tal coisa chamada de inevitabilidade no universo. Pensemos nos grandes impérios, maiores do que os maiores que hoje pontificam sobre a Terra, pensemos nas grandes dinastias, pensemos nas grande rotas comerciais, pensemos nos dogmas, em todos eles, religiosos ou políticos. Pensemos. Recordemos. Pensemos até no que sabemos sobre os dinossauros, seres que dominaram o mundo de forma absoluta durante milénios. Se pensarmos e se soubermos percebemos a nossa ignorância em falar em inevitabilidades.
Partindo desta análise geral centremo-nos agora num aspeto particular aglutinador dos tempos modernos: o dinheiro. O mundo gira em função dele como se do sol se tratasse parecendo caminhar para uma dependência absurda. E as qualidades humanas privilegiadas e apreciadas por esta cultura vigente, a cultura do dinheiro e da posse, são a ganância e a inveja. E perante a situação, nada se afigura como mais inevitável do que isto. E no entanto... existe memória. A memória de que as coisas nem sempre foram assim. A memória das primeiras sociedades humanas, por exemplo, os povos recoletores que viviam em comunidade e cooperação. Com efeito, a situação não é endémica ao ser humano e, ainda hoje, existem comunidades do mesmo tipo, micro-sociedades, projetos sociais e, sobretudo, culturas que observam a inveja e a ganância como moralmente inaceitáveis.
Assim, fica demonstrada a não existência de inevitabilidades. Cada ser humano que habita o planeta tem em si muitos mundos muito diferentes que traduzem caminhos também eles distintos.