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Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

Porto de Amato

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Ideia fixa em países adiantados

Então o quê? Não concebem um secretário de Estado filósofo, um ministro poeta, escritor elegante, cheio de graça e de talento? Não, bem vejo que não: têm a ideia fixa de que um ministro de Estado há-de ser por força algum sensaborão, malcriado e petulante. Mas isto é nos países adiantados, em que já é indiferente para a coisa pública, em que povo nem príncipe lhes não importa já em que mãos se entregam, a que cabeças se confiam.

— Viagens na Minha Terra, Almeida Garrett

publicado às 21:02

"Cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis"

Depois de publicar a parte da citação de Almeida Garrett que é mais conhecida, mais popular, digamos, dei comigo a revisitar o Viagens na Minha Terra. A citação em causa vem logo no terceiro capítulo e pareceu-me insuficiente. Com efeito, tanto o texto que a precede, como aquele que a ela se segue, são de uma riqueza tão assinalável que me parece indesculpável que não se lhes dê iguais honras de destaque.

 

Todo o parágrafo, que transcrevo em seguida, é de uma beleza muito rara no universo dos livros escritos em português, normalmente abundantes de um provincianismo que não permite reflexões deste género. Saliente-se antes ainda a incontornável pergunta que ecoa por entre as linhas do texto:

 

“No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana?”

 

Bravo, Garrett!

 

Não: plantai batatas, ó geração de vapor e de pó-de-pedra, macadamizai estradas, fazei caminhos-de-ferro, construí passarolas de Ícaro, para andar a qual mais depressa, estas horas contadas de uma vida toda material, maçuda e grossa, como tendes feito esta que Deus nos deu, tão diferente do que a que hoje vivemos. Andai, ganha-pães, andai: reduzi tudo a cifras, todas as considerações deste mundo a equações de interesse corporal, comprai, vendei, agiotai. — No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana? Que há mais umas poucas dúzias de homens ricos. E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico. — Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já deve de andar orçado o número de almas que é preciso vender ao Diabo, o número de corpos que se têm de entregar antes do tempo ao cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Roberto Peel, um mineiro, um banqueiro, um granjeeiro — seja o que for; cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis.

 

— Almeida Garrett, Viagens na Minha Terra

 

Viagens na Minha Terra, Livros de Bolso Europa América

 

publicado às 21:07

Quantos pobres são precisos, afinal, para produzir um, somente um, rico?

Almeida Garrett

 

E eu pergunto aos economistas-políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico.

 

— Almeida Garrett, in Viagens na Minha Terra.

publicado às 20:49

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