Sampaio da Nóvoa ou o paraquedista inocente e virgem
As gentes perspiram sempre (!) duma “lógica” a preto e branco que aplicam a tudo o que veem e a tudo o que mexe. É necessário que se combata e que se desconstrua tal forma de interpretar o mundo.
Um exemplo pertinente do que acabo de referir é a seguinte implicação de predicados: se estamos contra Marcelo Rebelo de Sousa, e eu estou e reafirmo-o para quem possa ter dúvidas, então devemos apoiar Sampaio da Nóvoa. Não há nada de mais errado.
As mesmas razões que me fazem rejeitar Marcelo, servem também para rejeitar Sampaio. Essas razões podem não obstante ser muito mais claras no caso de Marcelo o que até se traduz, bem refletido, num ponto a seu favor. Depois existe um paralelismo formal evidente entre os candidatos: percursos profissionais similares, uma certa forma artificial e distante de sentir o mundo que é própria de muitos académicos, assim como uma certa comodidade na movimentação e na ascensão nesses meios. Há muito de superioridade, há muito de arrogância disfarçada ora de excentricidade, ora de distanciamento, quer num, quer noutro. Serve este parágrafo, portanto, para sublinhar o que une os dois candidatos para lá do que os sustenta nesta campanha.
Particularmente, Sampaio da Nóvoa, o candidato, é um oportuno nome mais ou menos desconhecido: aparece na cena política inocente e virgem do que quer que seja, parece que nada do que aconteceu terá tido alguma coisa que ver com a sua pessoa, nenhuma decisão política teve o seu aval ou apoio e, portanto, daqui se conclui, erradamente, que Sampaio mantem a sua integridade intacta. A conclusão resulta errada porque, em democracia, toda a inação deve ser interpretada como uma ação de apoio indireto à posição vencedora e porque, no mais, existe a ação concreta de Sampaio da Nóvoa. Essa ação distingue-se sobretudo por ter tido na sua pessoa o carrasco que levou a cabo o processo de fusão das universidades da capital, a clássica e a técnica, algo que não devia ser muito impressionante para a generalidade da esquerda. Para quem não tem memória, tal processo foi executado no tempo de Sócrates e é motivo de regozijo para o candidato.
Para além disso, menos relevantes são as interrogações que se erguem sobre a sua ascensão na carreira, sobre o seu currículo e sobre o facto de ser um dissidente comunista. É que normalmente ser ex-militante comunista não abona muito em favor de quem o é, nomeadamente no que concerne aos valores da coerência e do caráter políticos.
Sampaio da Nóvoa apenas tem uma vantagem relativamente a Marcelo para efeitos de segunda volta: a sua vitória poderá (?) significar um prazo de validade um pouco mais alargado para este governo e essa perspetiva já é o bastante. Será o bastante no que à segunda volta diz respeito, porque relativamente à primeira... não existem males menores, nem paraquedistas inocentes e virgens.