Presidenciais 2016: o que está em causa
O cargo de Presidente da República Portuguesa pode ser observado através de, pelo menos, dois prismas diferentes.
No plano estritamente teórico o órgão da presidência é generoso em virtudes políticas e institucionais e foi concebido precisamente para tal. Com efeito, o Presidente da República, sendo um órgão não legislativo e não executivo, apresenta-se como um contraponto de poder relativamente quer ao Governo, quer à Assembleia. O chefe supremo das forças armadas detém o relevantíssimo poder de supervisão dos protagonistas políticos anteriores com base na letra da Constituição da República Portuguesa, podendo vetar ações legislativas e dissolver a Assembleia. Este potencial de contrapoder depositado sobre o cargo da presidência, e enfatizado pelo seu caráter a priori apartidário, confere ao nosso sistema republicano a possibilidade de evitar abusos de governação ou de autoritarismo. Neste sentido, o Presidente da República deve ser encarado precisamente como um último protetor da Lei da República.
Muitos países, mundo fora, não dispõem de uma figura com as especificidades do Presidente da República e, em vez de um sistema bicéfalo como o nosso, Governo/Primeiro ministro e Presidente, optam por unir os dois órgãos num só.
Do ponto de vista prático muita coisa poderá ser dita sobre o órgão de Presidente da República e, na maioria dos casos, de conteúdo pouco abonatório para o cargo. É difícil não cair nesse erro sobretudo quando, eleição após eleição, o inclino do Palácio de Belém comporta-se como um mero facilitador de estratégias partidárias de assalto ao poder ou como um turista de luxo sustentado pela pobreza da nobre praia lusitana. É muito difícil não criticar o órgão da presidência quando o Presidente se comporta amiúde como um extravagante Rei e quando a presidência se revela mais dispendiosa do que certas casas reais europeias.
Todavia, o bom senso exige que se separe a qualidade do instrumento do uso que dele é feito. O que está em causa nas eleições presidenciais de 2016 é o que está sempre inexoravelmente em causa: a escolha de uma personalidade com valor, com um passado que fale por si, acima de toda e qualquer estratégia que não seja o escrupuloso e estrito cumprimento da Constituição no contexto da defesa do seu povo. Em suma, a escolha não deve recair nem num cúmplice governativo, vulgo jarra de enfeitar, nem tão pouco num agitador com uma agenda própria em carteira. E é importante sublinhar a dramática relevância de se poder usufruir, em Belém, de alguém com uma interpretação genuinamente progressista e não retrógrada da Constituição em benefício de todo o povo.