Preparação para o OE 2018 — 1ª parte
A preparação do próximo orçamento de estado arrancou nos últimos dias a todo o vapor com reuniões bilaterais entre PS/governo e os parceiros parlamentares a terem lugar. O comportamento dos intervenientes tem sido coerente e em linha com o comportamento passado.
O PS/governo consegue manter uma dicotomia incorruptível entre discurso e prática, o que é a todos os títulos notável. Há uma tradição no PS, desde os tempos de António Guterres e Jorge Coelho, aliás, de deter quadros de formação e vocação primordial para padre. É o “diálogo”, é as “pontes”, é o sotaquezinho beirão, ao mesmo tempo que os mais descarados favorecimentos das grandes empresas e da banca têm lugar. É, assim, uma espécie de imagética adaptada de Frei Tomás que tem lugar nestas conversas preparatórias do orçamento de estado de 2018: acreditem-se no que ele (governo) diz, não se acreditem no que ele faz.
O Bloco de Esquerda, não tinha ainda qualquer conversa tido lugar, já anunciava medidas a tomar, linhas vermelhas que não poderiam ser ultrapassadas, escalões de IRS e outras que tais, assim, em jeito de ultimatos à base de pólvora seca. Depois do resultado deste último orçamento de estado, em que tanto, tanto, ficou por cumprir, falando apenas daquilo que terá ficado acordado, em que se legitimou uma continuidade aguada da austeridade da governação anterior, seria expectável uma atitude um pouco mais ponderada e prudente por parte deste partido, algo que, de todo, não se verifica. Não digo que o Bloco não retirará dividendos desta estratégia, sobretudo quando comparada com a diametralmente oposta estratégia do PCP. Não olvidemos ou menosprezemos esta sociedade espetáculo em que vivemos, animada por mentecaptos incultos que mais não são que ovelhas modernas equipadas com iPhones e iPads. Sabe-se lá o que esta gente, de princípios dúbios e frágil caráter, pensa sobre política, sobre economia ou sobre as relações humanas? É impossível adivinhar o sentido em que votarão nas próximas eleições.
No seu estilo reservado e ponderado, que é sinónimo de um partido de responsabilidade feito duma matéria da qual já não se fazem mais partidos hoje em dia, o PCP mantém-se também fiel a si próprio nestas conversas preparatórias do OE 2018. O PCP prefere sempre fazer as coisas desta forma. Se todos os partidos adoptassem idêntica postura, teríamos garantidamente uma política mais limpa, livre do chavascal mediático orgiástico em que se tornou. Mas os outros partidos não são como o PCP, nem esta sociedade está muito interessada neste tipo de valores, e o PCP não percebe que, deste modo fornece aos outros as armas para o derrotarem politicamente. PS e BE preparam a esta hora, mais que um OE para 2018, um plano para minimizar o PCP ao ponto de o poder extrair, como apêndice supérfluo, da coligação parlamentar. É que o PCP não fala, não exige, não aparece, agarra-se a princípios que só ele respeita, a acordos que apenas ele protege. O PCP participa num jogo a três sendo o único que respeita um conjunto de regras que apenas existem, não obstante o seu intrínseco valor, na sua própria cabeça.
O PCP não percebe que o seu nome está indelevelmente ligado a este governo e continua a agir como se não tivesse parte nele. O PCP não percebe que, quando este governo cair, de nada lhe vai valer esta atitude de separação entre as partes e que as ondas de choque atingi-lo-ão de igual modo. A situação que se avizinha afigura-se dramática para o PCP e a forma como o partido for capaz de lidar com toda esta situação pode tornar-se crucial para a sua sobrevivência política, isto é, dos sete ou oito pontos percentuais de eleitorado que normalmente nele vota.