Parentalidade contemporânea
Há uns tempos escrevi um artigo que deu muito que falar sobre a parentalidade contemporânea. As mães de hoje em dia são ridículas foi o ponto de encontro entre um desabafo suscitado pelas minhas vivências e uma reflexão filosófica que procurei fazer, como sempre, o mais seriamente possível.
Hoje, o assunto é de um certo modo revisitado a propósito da nova moda, cada vez mais assumida e descomplexada, dos hotéis e restaurantes de entrada vedada a crianças. O caso é retomado novamente num artigo do irmão ideológico online do Diabo escrito, o Observador.
É evidente que este género de restrição pela idade não é de forma alguma legalmente defensável apesar de, como o artigo refere, a situação se vir a alastrar na nossa sociedade. O que me interessa discutir não é isso. Cabe às autoridades competentes colocar um fim a cada um destes abusos.
O que é interessante é verificar que, respeitando ou não a lei, o problema está aí, a razão de ser desta discussão é real, é palpável, sentimo-la nos hotéis e nos restaurantes, ouvimo-la na rua e nos corredores das guloseimas e dos brinquedos dos supermercados: há uma nova geração de miúdos insuportavelmente mal educados e cujos pais não têm a mínima noção de como exercer a sua parentalidade.
É, por conseguinte, de natureza trivial constatar que a questão da interdição de crianças em hotéis e restaurantes nada mais é que uma forma dissimulada destes estabelecimentos enfrentarem o problema da má criação que grassa nesta nova geração de jovens. Não enfrentam o problema frontalmente, bem entendido, preferindo furar a lei a fazê-lo, por ventura pelo facto desta ser uma batalha social e coletiva que não se sentem preparados para travar.
A questão cultural assume aqui uma importância medular. O que impede um estabelecimento, se não as nossas próprias contingências culturais, de expulsar das suas instalações uma família cujos filhos não sabem ou não conseguem comportar-se de acordo com os padrões socialmente desejáveis? O resultado de não conseguir fazê-lo, associado ao facto de que estas famílias não sofrem qualquer penalização ou condicionamento social por persistirem nesta espécie de parentalidade incompetente — e, pelo contrário, muitas vezes até parece que são recompensadas por isso —, é este que vemos: uma sociedade cada vez mais a mais do que uma velocidade onde existem estabelecimentos onde todos podem ser incomodados por crianças mal educadas e outros onde apenas se pode ser incomodado por... adultos mal educados.
Enfrente-se o problema de frente. Faz falta uma maior — muito maior — disciplina nas escolas. Faz falta uma maior responsabilização dos pais pelas ações dos seus filhos. Faz falta substituir, num caso de agressão a um professor, por exemplo, as sempre convenientes desculpas para as ações dos jovens por penalizações sociais e criminais sérias para os pais. Faz falta isto e faz falta muito mais. Isto é apenas o começo do que faz falta e do que o Estado devia empenhar-se em implementar para começar a condicionar a boa educação das gerações futuras.
Ser-se pai ou mãe no século XXI deveria ser entendido como a responsabilidade das responsabilidades. É claro que as crianças serão sempre crianças e para uma criança, no meu entender, aplica-se a máxima do “quanto mais rebelde, melhor”. Mas não é disso que realmente falamos aqui. Há uma diferença entre a criança rebelde e a criança ditadora que manda nos pais. A primeira deve ser acarinhada e, o seu espírito curioso e rebelde, nutrido. A segunda deve ser — não tenhamos medo da palavra —, disciplinada.