O ministro cara-de-pau
Deixem-me ver se consigo descrever em poucas palavras o que se passa com os nossos enfermeiros especializados.
Há uma diferença, estabelecida na lei e lavrada nas tabelas remuneratórias, entre o salário de um enfermeiro sem especialização e um com especialização. Essa diferença anda à volta de mil euros, pelo que é substancial e deve ter motivado muitos enfermeiros a investir na sua formação para obter uma especialização. É claro que um enfermeiro especializado pode ser contratado para tarefas de enfermagem que não requeiram especialização e, nesse caso, será pago como um enfermeiro não especializado. O que tem acontecido, todavia, é de uma baixeza moral que quebra todas as barreiras.
Há vários anos a esta parte, os hospitais públicos e privados têm vindo a contratar enfermeiros com especialização, colocando-os em tarefas que requerem essa mesma especialização, mas oferecendo-lhes um contrato de enfermeiro sem especialização. Esta infame forma de se fazer as coisas tem-se prolongado no tempo alicerçada em promessas de alteração que nunca se cumprem, no elevado desemprego que afeta a profissão e numa ordem e sindicatos que, sinceramente, não sei o que estiveram a fazer até agora. É evidente que esta inadmissível situação teria que chegar a um ponto de saturação. Numa ação sobretudo simbólica, os enfermeiros têm entregado as suas cédulas de especialização e ameaçam com greve a toda e qualquer tarefa que requeira essa mesma especialização.
Face ao descrito, é preciso ter muita cara-de-pau para vir para as televisões apelidar o protesto dos enfermeiros de “ilegítimo”, “ilegal” e “imoral”. E mais: é preciso não ter um pingo de vergonha na cara.
Vivemos numa era engraçada, que disto não restem dúvidas. Vivemos numa era onde o indivíduo que nos rouba ou que, para todos os efeitos lidera a quadrilha dos que nos roubam, dos que diariamente nos ultrajam, ainda vem para a televisão e para os jornais insultar-nos na cara.
Volto a repetir esta ideia muito batida neste blog. Aqui estão as negociações do orçamento do estado. É aqui que elas estão, PCP e Bloco. A troco de umas esmolas a alguns reformados e a alguns funcionários públicos, está-se a apoiar um governo que consegue ser tão ou mais canalha para com quem trabalha (para com quem efetivamente trabalha neste país) do que o governo anterior. Pensem nisso. Para o vosso bem.