A “esquerda” do Bloco
Existem uns outdoors do Bloco de Esquerda espalhados pelas cidades que gritam, a propósito do Novo Banco, “banca pública ao serviço das pessoas”.
Esta frase que escolhi destacar dentro de aspas é de uma relevância enorme, profunda, para se entender a “esquerda” do Bloco.
A frase em si mesma aponta para a nacionalização da banca. Há uma certa ambiguidade que provém de não se perceber, à partida, se essa nacionalização que o Bloco pretende é geral, abrangendo toda a banca, ou particular, no que concerne apenas ao Novo Banco. Não obstante essa ambiguidade, que é muito relevante para a análise em questão, para se saber se o tratamento que se propõe é simplesmente tópico ou se é mais do que isso, global e estrutural, é indiscutível que se aponta para um caminho de nacionalização da banca.
Ora, é justamente aqui que se separa o trigo do joio no que à esquerda diz respeito. Porque se é verdade que a nacionalização da banca é algo de axiomático para quem quer que pense à esquerda, também é verdade que este tipo de opções encerram uma certa qualidade revolucionária e não encaixam no resto das peças do sistema capitalista. Neste ponto, importa perguntar quais são as opções do Bloco relativamente ao Euro e à União (Económica) Europeia? Qual é o seu plano para fazer face a um isolamento e segregação a que o capital votará o nosso país no caso de tais medidas serem tomadas?
É que o processo revolucionário não é fácil, nem trivial e não é um caminho de passos avulsos: é necessária coragem para enfrentar os muitos obstáculos, as inúmeras resistências do sistema, e coerência espinal para se poder encetar e percorrer o caminho da transformação da sociedade. O Bloco partilha da mesma linguagem revolucionária, mas quanto ao resto... revela um comprometimento absoluto com as regras do sistema e, se acaso enfrentasse a União Europeia, não contemplando uma rutura com a mesma e com as suas estruturas, recuaria à primeira contrariedade, tal como fez o seu irmão Syriza na Grécia.
“Banca pública ao serviço das pessoas”. Concordo e assino por baixo. Mas e depois? Podemos contar com o Bloco para a “guerra” que se seguirá?
Termino com uma nota. O Bloco fala em “pessoas” e não em “povo”. Acredito que o uso desta terminologia não é inocente e pretende ser diferenciador. Acredito que diz muito sobre a forma como o Bloco e a sua “nova esquerda” observam a sociedade. De que pessoas estamos a falar, afinal? Parece que, para o Bloco, já não existem classes sociais, nem luta de classes. Isso é coisa do passado. Isso é coisa de comunistas. Agora apenas existem pessoas.