A alma de um povo
No meio de tudo isto, de toda a tempestade que se ergueu e permanece ainda mais forte do que nunca, apesar do vendaval de mentiras semeado pelos dirigentes e erguido pelos meios de comunicação, apesar de tudo, o que para mim é importante é a evidência cabal de que uma grande parte do país perdeu uma boa parte da sua alma, daquilo que nos define não apenas como portugueses, mas como povo soberano e orgulhoso. Não restam dúvidas acerca disto.
A questão da dívida é paradigmática. Perante evidências claras sobre uma influência externa direta e determinante, o povo escolheu a oratória bacoca e provinciana da auto-culpabilização corporizada no atual governo, bem como no principal partido da oposição. O povo escolhe acreditar que é o culpado da situação e aceita a auto-punição ditada pela austeridade dita “necessária”. O povo admite a sua desonestidade, confirma que viveu muito acima das suas possibilidades e entrega-se voluntariamente às autoridades justiceiras estrangeiras, muito sérias e honestas. Isto é uma questão muito importante pois não encontra paralelo em mais nenhum povo do mundo que se encontrou, em algum momento da sua história, numa situação semelhante.
A atitude de Portugal durante estes anos passados valer-lhe-á, com efeito, a entrada para os anais de história antropológica mas inevitavelmente ver-se-á retratado como o povo que um dia deixou de o ser sem um único conflito, o disparo de uma qualquer bala ou a efervescência de uma qualquer revolução. Deixou de o ser, simplesmente, democraticamente.