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Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

Os símbolos de uma sociedade

Quando visitei Moscovo pela primeira vez fiquei fascinado com o edifício da universidade. Estaline mandou construir as mais altas torres no ponto mais alto da cidade, de tal forma que nenhum outro edifício da cidade pudesse suplantar em altura, e, concomitantemente, em importância, o edifício da universidade. O objetivo era claro: os mais adorados heróis da União Soviética haviam de ser os seus cientistas, os seus professores, todos aqueles que dedicassem a sua vida ao estudo e ao conhecimento. Esses deviam ser os primeiros ídolos da nação.

 

Este tipo de decisão é mais do que simbólica, já que marca indelevelmente a filosofia de uma sociedade, os seus princípios e em que é que a mesma se baseia, para o que é que vive, os seus objetivos e quem escolhe idolatrar. Primeiro estavam os homens da universidade, primeiro estava o conhecimento. Depois estavam os outros, cada qual com o seu quinhão de importância.

 

Esta visão cultural é indissociável do facto da União Soviética ter sido o estado que mais evoluiu num mais curto espaço de tempo, tendo pegado numa Rússia medieval e a catapultado para uma superpotência em todas as áreas do saber.

 

No nosso Portugal, todavia, os ídolos são outros: são os atores de novela, os cantores pop e os jogadores de futebol. Podemos ver, com efeito, que estamos no ponto diametralmente oposto àquele com que comecei este texto. Não é de estranhar, assim, a atribuição do nome Cristiano Ronaldo ao aeroporto da Madeira. Cristiano Ronaldo é apenas um jogador de futebol. Dá um chutos na bola. É muito bom naquilo que faz, mas é apenas um jogador de futebol, repito. Não sabe falar. Não tem uma ideia clara sobre nada de nada. Vive uma vida a ser bajulado pela fama e pelo dinheiro que tem. Todavia, é o ídolo do país. Seguindo os mesmos princípios, sugiro o nome de Tony Carreira para o novo aeroporto de Lisboa.

 

São estes os ídolos de Portugal. Não nos devemos admirar que 90% das crianças não gostem de Matemática, nem gostem de estudar. Os ídolos do país também não gostavam e nem por isso deixam de ser famosos e importantes e entretêm a malta com atividades sem interesse nenhum. É esta a construção de sociedade que escolhemos. Tudo isto são escolhas muito objetivas e muito conscientes que fazemos. A razão parece-me clara: entreter em vez de instruir. É sempre mais eficaz para se poder reinar sobre o rebanho.

 

http://www.telegraph.co.uk/content/dam/football/2017/03/30/124632319_REUTERS_A-bust-of-Cristiano-Ronaldo-is-seen-before-the-ceremony-to-rename-Funchal-Airp-large_trans_NvBQzQNjv4BqqVzuuqpFlyLIwiB6NTmJwfSVWeZ_vEN7c6bHu2jJnT8.jpg

 

publicado às 20:51

O PCP e a cultura do miserabilismo político

Acho que devemos ser exigentes na política, sobretudo nas áreas de que somos mais próximos. Percebo todos aqueles que assobiam para o ar e que preferem não apontar o dedo ao que é óbvio. Entendo bem. A política é uma batalha de ideais e as críticas devem-se reservar para os momentos de reflexão interna para não dar armas ao adversário. Tudo isto é verdade, mas tudo isto é inútil e contraproducente quando parece que se perde a razão ou o sentido das coisas. Repito: devemos ser ainda mais exigentes com o que nos é querido, precisamente porque para o que nos é querido queremos o melhor.

 

Há uns tempos, aquando da recondução de Jerónimo de Sousa no PCP, escrevi um artigo criticando a opção que, aos meus olhos, pareceu inconcebível. Volvidos alguns meses, todas as razões que fundamentaram a minha opinião permanecem intactas. O PCP escolheu reconduzir um secretário geral que se apresenta demasiadamente cansado e velho, que repete um discurso gasto, pejado de graçolas que já não têm graça nenhuma, uma presença infeliz e lastimável em todos os palcos que pisa, de onde se destaca negativamente o parlamento.

 

Malogradamente, esta lamentável condição do líder do PCP estende-se, quase que por contágio, a quase todos os parlamentares e políticos que representam o partido. Não sendo, muitos deles, demasiadamente velhos, a verdade é que o seu discurso parece ser escrito pela mesma pena, tamanha é a coleção de palavras comuns a todos eles. Não é isto de somenos, visto estarmos a falar da riquíssima língua de Camões, repleta de palavras sinónimas e de diferentes recursos estilísticos. Não obstante, desde os mais novos até aos mais velhos, parece que os papéis que leem são cópias de um mesmo original e o que dizem parece ter sido decorado numa espécie de ladainha de uma qualquer agregação religiosa. Novamente, entendo perfeitamente que alguma organização é necessária nestas matérias e que também é importante falar-se a uma só voz, mas isto... é demais. Todos os limites da decência intelectual são ultrapassados.

 

Enquanto que o Bloco de Esquerda, mesmo ali ao lado, exibe eloquentes vozes, discursos bem preparados e apelativos, parlamentares bem-apessoados, o PCP parece abdicar por completo dessa potencialidade fundamental no processo comunicacional. Ao fazê-lo de forma tão convicta, cria uma espécie de um culto do miserabilismo político, um culto do coitadinho. O PCP perde todos os debates? Não há problema, trata-se de um partido muito honesto, incapaz de passar a sua mensagem, mas honesto. As pessoas mudam de canal quando um comunista começa a falar? Não há problema, há de cair uma luz qualquer que as fará ouvir o que se tem para dizer.

 

Não interessa que o Bloco de Esquerda seja a conglomeração política mais incerta que existe em Portugal. Uma coisa não tem nada que ver com a outra. O Partido Comunista Português devia começar a olhar-se ao espelho e ver bem a figura que tem e a imagem que transmite.

 

Escrevo estas palavras motivado pelo conhecimento que tive de alguns dos candidatos do PCP a algumas das maiores autarquias da região do Porto. Ilda Figueiredo, por exemplo, é a candidata à Câmara Municipal do Porto. Ilda surge na mesma lógica da recondução de Jerónimo de Sousa: é uma figura histórica, de valor incomensurável para o PCP, mas com evidente falta de energia para tamanhas responsabilidades que o cargo exige. Mas por toda a região do grande Porto, os exemplos sucedem-se. Fosse esta situação o resultado da falta de quadros válidos e eu não estaria a escrever estas linhas. O problema é outro e é muito mais grave. É esta cultura de miserabilismo político, este fechamento interno, esta filosofia de seita religiosa, de organização piramidal, esta relação de pastor com as suas ovelhas.

 

Custa-me muito escrever estas palavras, mas acho que já chega de me tomarem por parvo, a mim e a tantos como eu, progressistas, marxistas, intelectuais altruístas sem qualquer interesse pessoal na política que não seja o de servir a comunidade.

 

Quando o PCP não faz do povo parvo, como por exemplo com Bernardino Soares em Loures, o povo responde afirmativamente. Quando o PCP começa a jogar o jogo do coitadinho, o povo responde de acordo, sempre. Esta parece ser uma lição difícil de aprender para o Partido Comunista Português.

publicado às 15:30

As reversões que importam

Amanhã perfazem um ano e quatro meses desde a formação do vigésimo primeiro governo constitucional. Desde então, os únicos beneficiados da ação governativa deste executivo foram os funcionários públicos, os reformados e os pensionistas, que recuperaram o que lhes havia sido roubado.

 

Continuo a aguardar que as reversões se estendam aos demais trabalhadores, sobretudo aos mais jovens para os quais o conceito de “contrato de trabalho” começa a mitificar-se já numa ilusão apenas presente nas histórias contadas pelos seus pais.

 

É claro que esperar que aqueles que começaram o enterro do Código de Trabalho em Portugal — caso evidente de Vieira da Silva — no tempo dos governos PS de Sócrates, o revertam agora pode resultar numa longa espera.

 

Estou a ser sarcástico, claro.

 

Este governo PS nunca colocará o seu dedo nas reversões a sério, nas reversões que realmente importam e, acaso fosse forçado a isso por pressão de PCP e Bloco de Esquerda, acabava-se aí mesmo a história de vida da “geringonça”.

 

E é exatamente isto que é revoltante. É perceber isto, tão claramente quanto a realidade nos mostra, que faz cair a máscara a estes partidos e revela a sua grotesca face. PCP e Bloco estão a suportar uma solução governativa em tudo idêntica, no que é essencial, ao governo anterior. Costa é um Passos sorridente e de abraços, de falinhas mansas.

 

Não acreditam no que digo? Visitem as fábricas e os locais de trabalho. Perguntem às pessoas que trabalham se estão a ganhar mais ao final do mês. Perguntem se se sentem mais seguras no seu trabalho. Perguntem se elas sabem o dia de amanhã. Perguntem-lhes claramente se elas temem ser dispensadas sem qualquer razão objetiva. E perguntem-lhes se se sentem protegidas pelo sistema se isso acontecer.

 

O país, todavia, tem uma outra energia. Não se percebe é a razão de ser dessa nova energia, mas ela aí está, propalada pelos media, apoiada numa onda de importações e numa sempre renovada propaganda de incentivo ao consumo e ao crédito. A experiência acumulada diz-nos que esta história não acabará bem, sobretudo quando as bases deste consumo tornaram-se ainda mais débeis com os anos da austeridade. O país tem menos produção e está mais desequilibrado na distribuição dessa menor riqueza produzida.

 

Os meus leitores podem anotar, se quiserem: o próximo resgate já vem a caminho, cavalga veloz na nossa direção. A velocidade com que chegará será inversamente proporcional ao nível de exigência que tivermos para com este governo, exigência para que este faça as reversões que realmente importam: código de trabalho — maior estabilidade, segurança, valorização da contratação coletiva e irradicação dos falsos recibos verdes —, distribuição de riqueza — aumento generalizado dos salários — e aumento da produção nacional — com um plano sério de investimento, que se impõe, para a exploração dos recursos naturais, culturais e intelectuais do país.

 

Sem um tal conjunto de reversões, é essencialmente indiferente para o futuro do país dar-se mais esta ou aquela migalha a este ou aquele grupo de pessoas e esbatem-se quaisquer teóricas diferenças remanescentes entre esquerda ou direita.

publicado às 09:05

Paternidade

O caminho de cada um de nós não se principia no dia em que nascemos. É anterior a esse momento. Nós somos os continuadores de algo maior que nos transcende. Não interessa se disso temos ou não consciência. É mesmo assim.

 

Muitos dos problemas das sociedades começam exatamente aqui, na falta de consciência disto mesmo que escrevo. Somos para aqui paridos, abandonados cada um à sua sorte, sem saber de onde vimos, quanto mais para onde vamos, sem termos consciência do que somos, sem ideia do que devemos ser, ambicionar ou construir.

 

Paternidade é, acima de tudo, isto que acabei de escrever: não deixar que os filhos cresçam órfãos de ideias, órfãos da sua própria história, como se fossem corpos inanimados de alma, enjeitados à sua própria sorte.

 

Dedico este texto ao meu Pai, por ser o melhor Pai que um homem pode ser.

Por me dizer:

 

“Filho, tu vens daqui.

Vês?

Percorremos este caminho que se estende nas nossas costas com as nossas dificuldades, com o nosso trabalho.

Vês?

Mas chegámos até aqui, onde estamos agora.

E os teus avós são estes. E os teus bisavós aqueles ali.

E estes aqui são os nossos valores: a solidariedade, o trabalho, a amizade, o caráter, a integridade, a honra.

É disto que nós somos feitos. É este o nosso património. Não são casas, nem contas, nem carros, nem cordões de ouro. É isto aqui — dizia ele, sentado ao meu lado, apontando para o peito —. É isto aqui.

É disto que tens que pôr em cada coisa que faças ao longo da tua vida.”

 

Amanhã é o Dia do Pai. Sem a celebração de um significado substantivo, transformador, para o conceito de paternidade, repete-se neste dia um ritual capitalista sem sentido, de consumo frívolo, de celebração de coisa nenhuma. Os filhos oferecem presentes aos pais para expressar a sua gratidão por simplesmente terem sido gerados, por terem sido postos ao mundo.

 

Não, Pai: eu agradeço-te pelo que me deste e pelo que ainda hoje me dás, pelo que é invisível mas ao mesmo tempo tão essencial porque me dá força e sentido para eu ser quem sou e o que almejo ser. Agradeço-te, Pai, por não ser hoje um indigente no campo da família, dos valores ou as ideias, por ter uma estrutura que me suporta a todo o instante, que toma parte e que é parte de mim em todas as minhas escolhas. Agradeço-te, Pai, por me teres dado uma família. E agradeço-te, também, por não ter começado do zero, por poder ser continuação, como se o meu corpo e mente transportassem o que é teu e o que é da Mãe, o que é dos avós e dos bisavós.

 

A nossa existência, Pai, não é em vão.

 

http://data.whicdn.com/images/52367366/large.jpg

 

publicado às 23:33

Paulo “Surreal” Macedo

Para mim é surreal ver o mesmo Paulo Macedo que foi ministro porta-estandarte do governo PSD-CDS e, portanto, conivente com toda a panelinha que conduziu ao calamitoso estado atual da Caixa Geral de Depósitos, a assumir o papel de salvador da Caixa Geral de Depósitos e a dizer coisas como: “Não se percebe como deixaram a CGD chegar a estes pontos!!...”.

 

Surreal!

 

De resto, nota-se coerência no homem, lá isso nota-se! O plano de Macedo, seja para onde quer que ele for chamado, é sempre o mesmo: cortar, cortar e cortar. Na CGD vai acontecer — já anda a ser anunciado — o mesmo que aconteceu no ministério da saúde: cortes sobre cortes, despedimentos massivos, encerramento de agências, que é para endireitar a coisa. Consta até que, certa vez, para salvar a sua família, Macedo terá despedido um cão e dois periquitos amarelos, porque estes lhe estavam a dar muita despesa e a tornar a sua situação inviável.

 

Volto a repetir: não percebo porque é que Paulo Macedo é especial e por que é pago a peso de ouro. Qualquer um faria o mesmo. O difícil é reorganizar e otimizar.

 

E também isto é... surreal!

 

http://sm2.imgs.sapo.pt/mb/E/y/u/o/0ffu3CCJtyO111F5fCGk0tk_.jpg

publicado às 01:20

Cristas estava bem era em Fátima, a vender figurinhas

Vale a pena escutar com atenção as declarações do CDS a propósito deste escândalo dos offshores. Em particular, vale a pena atentar nas reações da impoluta líder daquele partido, Assunção Cristas, que, aliás, por tão católica ser, faz questão de alumiar por aí que batizou todos os seus filhos de “Maria” por sentida devoção a Nossa Senhora.

 

Vamos a elas (notícia completa aqui).

 

Sobre o facto de Paulo Núncio ter trabalhado para empresas com negócios em offshores, diz a Sra. Dona Assunção Cristas:

 

Creio que também aí há ruído e uma coisa não tem nada a ver com a outra. E eu penso que isso ficou bastante esclarecido e não vale a pena estar a tentar criar nexos que não existem.

 

Não há nexos, diz ela. É uma daquelas coincidências... É só ruído. Vê-se bem que se trata de uma mente brilhante, letrada. Vejam como ela desmonta a falácia que nos impuseram:

 

No limite se nós acharmos que ninguém pode ter uma vida profissional antes de cargos governativos, então vamos ter um problema muito grande porque só podem ser governantes professores, académicos, professores de liceu e gente que não tem uma vida privada. Vale a pena perguntar se é o sistema que nós queremos e se é essa democracia que queremos construir.

 

Pois é... ninguém quer um sistema desse género... E entregar o país a professores de liceu?! Essa gentinha?! Ui... Deus nos livre. Ah, queira a Sra. Dona Assunção perdoar a invocação do nome de Deus em vão. Caros leitores, estejam todavia descansados, pois a impoluta líder do CDS diz estar muito empenhada no apuramento da verdade:

 

Do lado do CDS há todo o empenho em que tudo seja esclarecido, doa a quem doer. E estamos muito tranquilos nesta matéria. O próprio doutor Paulo Núncio sempre se disponibilizou e não tem nenhum problema em prestar qualquer esclarecimento ao parlamento.

 

Ufa! Que alívio! É que eu já estava a pensar que a Sra. Dona Assunção estava para aqui a defender o gatun... o “doutor” Paulo Núncio, mas afinal está interessada no apuramento da verdade! Doa a quem doer!

 

Não?

 

Estou enganado?

 

Não é doa a quem doer?

 

É doa a quem doer desde que o “doutor” Paulo Núncio não sofra nenhum dói-dói?

 

Fiquei confuso... Já não percebo nada...

 

O que é triste é ver gente do meu país muito preocupada com Le Pens e Trumps além fronteiras e, por cá, adorar peças destas. Até dizem que está muito bem colocada para atacar a Câmara Municipal da capital!

 

Assunção Cristas estava bem era em Fátima, por estes dias, junto dos outros “vendilhões do templo” a vender figurinhas dos pastorinhos. É para isso que tem talento e... caráter.

publicado às 18:44

Democracia é escutar e debater

Sobre o caso da proibição da intervenção de Jaime Nogueira Pinto na Universidade Nova de Lisboa apraz-me dizer o seguinte.

 

Tenho sempre muito gosto em ouvir alguém com um mínimo de cultura e de inteligência, convicção e coerência nos seus ideais, por muito que deles discorde. Este tipo de pessoas são um caso raro na nossa sociedade. Quando as encontramos, devemos aproveitar, porque a maioria das que pululam pelos espaços opinativos são caricaturas de cata-ventos ideológicos, movidos apenas pelos seus próprios interesses, culturalmente medíocres e intelectualmente menores.

 

Repito: quando as encontramos, por muito que delas discordemos, devemos aproveitar. Pode ser que aprendamos alguma coisa.

 

E, também, se não por mais nada, porque democracia é isso mesmo, é escutar e é debater.

publicado às 22:02

Uma pergunta sobre as offshores

Será que se Passos Coelho e seus compinchas se tivessem calado um bocadinho com os fait divers sobre o Ministro das Finanças ter ou não ter mentido, estaríamos hoje a debater o caso dos dez mil milhões nas offshores?

 

A minha intuição diz-me que não.

 

Este assunto não tem interesse nenhum a não ser como uma bofetada na face dos apóstolos do antigo governo PSD-CDS e é usado apenas na justa medida de uma retaliação. Mais: nada de substantivo será produzido a partir desta questiúncula. Lembram-se? Não era esse o objetivo.

 

Retire-se, portanto, o dramatismo à coisa. Trata-se de jogatana política pura e dura. Os milhares de milhões não param nem pararão de fluir deste país, seja para o Panamá, seja para uma ilha qualquer do Pacífico. E sempre, sempre, com a benção sentida quer de PSD-CDS, quer de PS. Isto é o capitalismo no seu esplendor!

 

http://editorialcartoonists.com/cartoons/ZygliA/2016/ZygliA20160406A_low.jpg

 

publicado às 16:18

O cromo dourado do regime

http://mediaserver4.rr.pt/newrr/paulo_nuncio195737ad_base.jpg

 

Este Paulo Núncio é um daqueles personagens que dá gosto ouvir falar. Hoje, na comissão de inquérito que decorre a propósito da pouca vergonha dos dez mil milhões de euros que se evadiram de Portugal sem dar cavaco às tropas, Paulo Núncio produziu um manancial de afirmações que deviam ser estudadas ao pormenor, pois são capazes de produzir um retrato fiel deste regime desavergonhado em que vivemos e ao qual chamamos de capitalismo.

 

Pois então, ao que parece, Paulo Núncio ensaiou aquele teatro todo de se demitir dos cargos afetos ao CDS por razão absolutamente nenhuma:

  1. Paulo Núncio nada fez de errado.
  2. Ninguém, aliás, fez nada de errado, quer no governo, quer na autoridade tributária.
  3. Mesmo que Paulo Núncio tivesse feito algo de errado, visto que se auto-intitula o “campeão do combate à evasão fiscal” (do peixinho pequenino, é certo), está automaticamente imune a qualquer crítica.
  4. A publicação da lista das transferências para offshores não tinha caráter obrigatório.
  5. Um estado “de tipo europeu” não deve acompanhar de perto as transferências que se fazem, mesmo as de montantes estratosféricos. O contrário apenas é feito na Venezuela.
  6. O dinheiro transferido nada tinha que pagar de imposto.
  7. Como advogado, trabalhou para diversas empresas que lidam diariamente com offshores mas nunca trabalhou diretamente na área dos offshores.

 

A lista continua. A partir deste momento, começa a deixar de ser divertido e começa a enojar. Paulo Núncio, houvesse uma caderneta de políticos serventuários dos interesses do capital privado, ocuparia um lugar de destaque, seria um daqueles raros cromos dourados. O seu discurso preparado de véspera é simbólico. O seu discurso é paradigmático no seio do regime. O escândalo aconteceu e é visível para todos mas, no entanto, ninguém fez nada de errado. As coisas aconteceram porque... é a vida! E, no fim do dia, Paulo Núncio ainda é credor de uma comenda pelos altos serviços prestados ao país.

 

Segundo Paulo Núncio, apenas na Venezuela se acompanha este tipo de transferências no momento. Não tenho como afiançar esta afirmação. O que posso dizer é que, tivesse este escândalo acontecido na China e Paulo Núncio não estaria a dar baile numa comissão de inquérito parlamentar, mas sim a enfrentar um pelotão de fuzilamento.

 

Se me perguntarem se concordo com a pena capital, digo que não, que não concordo, seja em que circunstância for. Mas se me perguntarem se teria pena ou se consideraria injusto, neste caso em particular, diria que não, também. Sem dúvida que não. Ninguém assume responsabilidade por nada neste país “de tipo europeu”. É desesperante se pensarmos um pouco nisso. É um escândalo em si mesmo.

publicado às 14:47

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