Mais força que qualquer verdade
Como o mundo está cravejado de anticomunistas, qualquer coisa que se diga sobre um comunista, por muito estapafúrdio que possa soar, medra. Qualquer mentira que se diga torna-se verdade. Ninguém pensa sobre o que ouve ou sobre o que repete.
Noutro dia, ouvi esta barbaridade dita por um amigo meu: “o Fidel comia lagosta diariamente ao almoço, enquanto o povo passa fome”. A barbaridade não era da sua autoria. Leu-a de um adolescente anticomunista que, pelos vistos, trabalha para o Semanário Sol e escreve barbaridades para o Jornal i. Tenho notado que ser-se um ignorante anticomunista faz muito bem em termos de carreira. O adolescente vai muito bem lançado.
Em primeiro lugar, ninguém passa fome em Cuba e tão pouco existe mendicidade. Mas não dispersemos, vamos ao busílis da afirmação: a lagosta!
Quem tem o privilégio de visitar Cuba, mesmo aqueles que não saem das estâncias balneares de Varadero, todo incluido, mesmo aqueles que têm medo de se misturar no meio da multidão, conseguem vislumbrar, ao longe, no mar, pescadores cubanos, por vezes a bordo de uma simples câmara de ar, a pescar a dita cuja lagosta, em boa verdade, uma espécie de lagostim que existe em grandes quantidades ao largo da costa cubana.
Quem ouve tamanho disparate de que Fidel comia lagosta todos os dias, pensa que comer lagosta em Cuba é tão precioso como comer lagosta em Portugal. Mas não. É ainda mais comum do que comer sardinhas assadas. Se refletirmos um pouco, todavia, seria altamente improvável que Fidel mantivesse uma tal dieta e conseguisse simultaneamente atingir os noventa anos de idade.
Tive eu o trabalho de explicar tudo isto ao meu amigo. Ele, todavia, não ficou muito convencido. Prefere acreditar-se nos disparates do adolescente anticomunista que nunca visitou Cuba. É que na verdade, as barbaridades que se escrevem sobre Fidel e sobre Cuba vão de encontro ao que ele próprio acredita. E isso tem muita força. Tem muito mais força que a força de qualquer verdade ou evidência.