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Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

Porto de Amato

Porto de abrigo, porto de inquietação, porto de resistência.

É verdade: Jesus tinha dois pais

O cartaz do Bloco de Esquerda, “Jesus também tinha 2 pais” é realmente excelente. No bom estilo Pop Art de Warhol, defende a adoção por casais do mesmo sexo ao mesmo tempo que critica com mordaz ironia o dogma religioso. É assim uma espécie de dois em um. A crítica atinge o mundo católico em pleno no âmago das suas contradições, sendo que a Igreja nem por isso se coíbe de se constituir como principal opositora a uma tal mudança de costumes. É verdade: segundo a letra da sua própria doutrina, Jesus tinha dois pais.

http://images-cdn.impresa.pt/expresso/2016-02-26-Cartaz-Bloco-de-Esquerda-/original/mw-768

O Bloco de Esquerda está de parabéns. Devo reconhecer que o que lhe falta em consistência ideológica abunda em imaginação e criatividade.

 

Claro que, entretanto, devido à chuva de críticas que tem caído sobre o Bloco, elementos do mesmo, incluindo Marisa Matias, já vieram dizer que “foi um erro” e coisas do género. Se me faltassem evidências para sustentar a afirmação sobre a inconsistência ideológica do Bloco que fiz no parágrafo anterior, o Bloco encarregou-se de me providenciar uma bem fresquinha.

 

Isto faz-me lembrar quando o Bloco decidiu não participar das negociações de 2011 com a Troika para depois se mostrar muito arrependido em face dos resultados eleitorais obtidos. O Bloco de Esquerda parece que tudo o que faz é em nome dos resultados e dos efeitos e não em nome das suas convicções. Parece que, no Bloco, a mão que lança cada pedra política está sempre a postos para se esconder, numa tentativa frívola de emenda, se acaso a pedra chatear muita gente.

 

O tratamento que a sociedade faz, em geral, relativamente a este género de intervenção e crítica social também é de relevar. É que, formalmente, comportamo-nos exatamente do mesmo modo que todas as sociedades islâmicas mais ortodoxas que tão veementemente criticamos e até desprezamos. Não rebentamos bombas, até ver, mas somos tão radicais no que dizemos e no que pensamos e temos tão péssimo sentido de humor, ou até pior, do que qualquer radical de qualquer religião. Mas é sempre mais fácil criticar nos outros o que não conseguimos reconhecer em nós próprios.

publicado às 08:30

Rebanho

A discussão em torno do orçamento de estado de 2016 tem gerado uma fúria popular bem audível para quem quer que se movimente por entre as povoações do país. Essa fúria é motivada essencialmente por uma deceção visceral a propósito da inverosímil e inacreditável união parlamentar das esquerdas e que encontrou bode expiatório na reposição de salários e horários de trabalho na função pública.

 

É importante assinalar que esta ira provem do mesmo lugar de onde medraram quer a complacência quer a aceitação quando estes mesmos salários foram cortados e quando os respetivos horários foram incrementados. É decisivo contemplar este facto para podermos afirmar com propriedade científica que o povo português não é mais do que um rebanho de invejosos que procura no mal alheio o seu próprio bem.

http://www.cartoonmovement.com/depot/cartoons/2011/12/01/totalitarian_election__sergei_tunin.jpeg

 

Com isto não desprezo toda a crítica ao orçamento e até mesmo a um certo entendimento legítimo de tratamento desigual na sociedade. Não obstante, importa relevar este sentimento popular endémico, porque o Homem evoluído, o Homem do futuro, terá que forçosamente nutrir entendimentos diametralmente opostos, no sentido de poder vir a adotar comportamentos distintos na construção de uma sociedade que seja mais justa em substância.

 

O português médio revolta-se com o colega de trabalho, ao mesmo tempo que bajula e endeusa o seu patrão. O português médio não faz uma greve nem mexe uma palha para melhorar a sua condição, mas, simultaneamente, corre para a janela do seu apartamento para apelidar de preguiçoso quem o faz e se manifesta na rua. O português médio revolta-se atrás das cortinas contra o carro novo do vizinho e rebola de felicidade se este aparece à noite com o seu carro espatifado. O português médio não ambiciona alcançar um nível superior: antes ambiciona o rebaixamento do seu vizinho para o seu próprio nível.

publicado às 11:45

A “esquerda” do Bloco

Existem uns outdoors do Bloco de Esquerda espalhados pelas cidades que gritam, a propósito do Novo Banco, “banca pública ao serviço das pessoas”.

 

Esta frase que escolhi destacar dentro de aspas é de uma relevância enorme, profunda, para se entender a “esquerda” do Bloco.

 

A frase em si mesma aponta para a nacionalização da banca. Há uma certa ambiguidade que provém de não se perceber, à partida, se essa nacionalização que o Bloco pretende é geral, abrangendo toda a banca, ou particular, no que concerne apenas ao Novo Banco. Não obstante essa ambiguidade, que é muito relevante para a análise em questão, para se saber se o tratamento que se propõe é simplesmente tópico ou se é mais do que isso, global e estrutural, é indiscutível que se aponta para um caminho de nacionalização da banca.

 

Ora, é justamente aqui que se separa o trigo do joio no que à esquerda diz respeito. Porque se é verdade que a nacionalização da banca é algo de axiomático para quem quer que pense à esquerda, também é verdade que este tipo de opções encerram uma certa qualidade revolucionária e não encaixam no resto das peças do sistema capitalista. Neste ponto, importa perguntar quais são as opções do Bloco relativamente ao Euro e à União (Económica) Europeia? Qual é o seu plano para fazer face a um isolamento e segregação a que o capital votará o nosso país no caso de tais medidas serem tomadas?

 

É que o processo revolucionário não é fácil, nem trivial e não é um caminho de passos avulsos: é necessária coragem para enfrentar os muitos obstáculos, as inúmeras resistências do sistema, e coerência espinal para se poder encetar e percorrer o caminho da transformação da sociedade. O Bloco partilha da mesma linguagem revolucionária, mas quanto ao resto... revela um comprometimento absoluto com as regras do sistema e, se acaso enfrentasse a União Europeia, não contemplando uma rutura com a mesma e com as suas estruturas, recuaria à primeira contrariedade, tal como fez o seu irmão Syriza na Grécia.

 

“Banca pública ao serviço das pessoas”. Concordo e assino por baixo. Mas e depois? Podemos contar com o Bloco para a “guerra” que se seguirá?

 

Termino com uma nota. O Bloco fala em “pessoas” e não em “povo”. Acredito que o uso desta terminologia não é inocente e pretende ser diferenciador. Acredito que diz muito sobre a forma como o Bloco e a sua “nova esquerda” observam a sociedade. De que pessoas estamos a falar, afinal? Parece que, para o Bloco, já não existem classes sociais, nem luta de classes. Isso é coisa do passado. Isso é coisa de comunistas. Agora apenas existem pessoas.

publicado às 12:43

A crítica trivial

Criticar o Governador do Banco de Portugal é o exercício mais trivial e mais fácil que pode ser realizado. A ação, a figura e o cargo do Governador do Banco de Portugal são tão criticáveis de tantas formas diferentes que, diga-se o que se disser, a probabilidade de se acertar na crítica é próxima de cem por cento. Com efeito, há pelo menos três dimensões distintas a considerar.

 

A ação. Há uma incapacidade propriamente dita fruto da ação de supervisão bancária concreta. O último capítulo desta, por ora, escreveu-se no Banif.

 

A figura. Carlos Costa é um banqueiro que “almoça” e se “deita” com banqueiros e, no final do dia, finge que os supervisiona. A isto acresce ainda a ausência de independência e neutralidade política na execução das suas tarefas, decorrentes do seu posicionamento político nacional e europeu.

 

O cargo. A competência de supervisão bancária é, no quadro atual de correlação de poderes na nossa economia, uma abstração impraticável, um verbo de encher e um punhado de areia jogado para os olhos do povo.

 

Por estas razões, não se trata de uma ação de particular iluminação ou virtude o PS criticar a ação do Governador. Por seu turno, ouvir os políticos e individualidades de direita apontar o dedo a António Costa pelo facto deste o fazer é, mais do que uma vergonha, um insulto, depois de quatro anos de pressão miserável sobre os juízes do Tribunal Constitucional. É, todavia, compreensível: para a direita os interesses do capital sobrepõem-se a tudo o resto, inclusivamente à própria lei.

publicado às 20:23

Dizendo as coisas como elas são, para além de todo o preconceito

https://s3-us-west-2.amazonaws.com/nationaljournal/double-dippers/img/Sanders.png

 

Everything we feared about communism — that we would lose our houses, savings, and be forced to labor eternally for meager wages with no voice in the system — has come true under capitalism.

 

Tudo aquilo que temíamos no comunismo — perder nossas casas e posses, nossas economias, ter de trabalhar duro por um salário miserável sem voz no sistema — se realizou graças ao capitalismo.

 

— Bernie Sanders, candidato pelo Partido Democrata às primárias nos Estados Unidos da América

publicado às 19:41

O predicado do OE 2016

O orçamento de estado de 2016 é digno, à partida, de um predicado que escapou a todos os orçamentos de estado apresentados nos últimos quatro anos: respeita a Constituição da República.

 

Poder-se-á argumentar que é pouco. O facto, todavia, atesta bem o estado a que a República chegou.

 

https://fotos.web.sapo.io/i/oc504086c/6517676_UTQgc.jpeg

 

publicado às 10:09

UTAO, défice estrutural e regra de ouro

As sociedades ocidentais encontram-se capturadas numa engenhosa rede tecida ao longo dos anos pela classe dominante e que não se circunscreve hoje à simples pressão mediática, económica e política. O capitalismo criou estruturas para lá dos jornais e dos meios de comunicação que usa para condicionar de forma organizada a ação governativa.

 

http://images-00.delcampe-static.net/img_large/auction/000/276/760/937_001.jpg

 

Atente-se no caso português.

 

O que é a Unidade de Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) se não um gabinete de pressão política sobre a ação governativa, disfarçada de entidade independente? Mais: o que é esse conceito exótico do “défice estrutural” se não uma abstração, uma artificialidade, criada com o propósito de condicionar as decisões políticas? E a meta dos três pontos percentuais para o défice? A que propósito? Qual a justificação para a pomposamente apelidada de “Regra de Ouro”?

 

Estes são apenas alguns exemplos de como o capitalismo se enraíza nas sociedades e coloca os povos do mundo a jogar o jogo político/económico de acordo com as suas regras, as regras do capital, pelo que condicionado logo à partida.

 

Não existem justificações objetivas e cabais para o uso da “Regra de Ouro”, é um número como poderia ser outro qualquer, que apenas adquire significado no contexto do desenvolvimento económico do país em questão.

 

De modo análogo, não existe justificação para a utilização prática do conceito do défice estrutural, uma abstração impossível de calcular de forma isenta e transparente e que pertence unicamente ao campo do estudo económico, devendo por isso estar vedada do espaço político.

 

Por fim, diga-se que a UTAO não procede de forma independente ou politicamente neutra, nem podia. Deixemo-nos de inocências: os seus relatórios são redigidos de acordo com um determinado paradigma económico assente em pressupostos arbitrários. Modelos económicos distintos induziriam conclusões distintas.

 

Cada um dos anteriores encontra apenas justificação numa orientação de natureza arbitrária e despótica que nos é imposta, não sendo, portanto, consequência de nenhuma lei natural. O seu objetivo encontra-se entre a manutenção dos poderes e o assegurar da dinâmica de concentração da riqueza. O seu objetivo é a proteção do sistema capitalista e da burguesia, a classe que domina todas as outras.

publicado às 17:54

Apriorismo de opinião

No que à formação de opinião diz respeito, confesso-me apriorista. Nem racionalista, nem empirista: apriorista.

 

Ainda antes de observar o problema ou diferendo em detalhe, muito antes de conhecer os factos que o rodeiam, a pessoa humana contém dentro de si a sua resposta que não é mais do que o resultado de um posicionamento político a priori. É verdade que essa resposta pode sofrer alterações com a experiência e com a influência do meio, todavia cabe a algo que reside no lugar mais íntimo e reservado do indivíduo a primazia no momento da formação de opinião. Nada é tão marcante ou duradouro quanto a bagagem sentimental, não racional, de que o indivíduo é dotado no momento da sua conceção.

 

E é por esta acurada razão que toda a transformação social, política ou, simplesmente antropológica, é tão morosa, tão árdua, em que cada passo lançado em diante parece preceder dois passos dados à retaguarda. Por vezes, parece que cada revolução resulta da indução massiva de um certo estado de ebriedade, findo o qual as massas rejeitam o processo e retomam o estado de equilíbrio anterior, aquele que mais vai de encontro ao seu posicionamento político apriorístico.

 

Por feliz e virtuoso acaso, entre uma e outra revolução permanecem resquícios, como que sementes revolucionárias, que se agarram ao solo e ganham raízes e a Humanidade assim evolui, lentamente, semente a semente, entre cada descuido da sua própria essência.

publicado às 14:53

A hipocrisia endémica

Para mim é sempre fascinante observar a hipocrisia latente ao comportamento de tantos e tantos ditos liberais, acérrimos defensores do mercado livre. Escrevo estas palavras a propósito do atual diferendo Rui Moreira - TAP/António Costa, que é uma espécie de constructo mediático destinado, quem sabe, a catapultar, a prazo, a figura de Rui Moreira para outros voos políticos.

 

O diferendo em questão é um som de fundo que, por se prolongar há um par de semanas, começa a tornar-se desagradável. Não percebo o que institucionalmente o Presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, tem que ver com a gestão que é feita do Aeroporto de Pedras Rubras ou sequer da TAP. Creio que institucionalmente não existe qualquer relação. A sua posição é, todavia, entendível.

 

É evidente que o tipo de gestão que é feita do aeroporto, seja ela pública ou privada, afeta diretamente a coisa pública, particularmente a coisa pública da região norte. Neste contexto, a estratégia da companhia aérea atualmente mais relevante para a atividade do aeroporto, a TAP, que passa por suprimir diversos voos, tem obrigatoriamente que ser vista com olhos pejados de grave preocupação. E é de todo em todo natural que essa preocupação seja vocalizada na pessoa do presidente da autarquia mais relevante da região norte.

 

Note-se que reside exatamente aqui, no parágrafo anterior, a argumentação de todos os que se opõem à privatização de aeroportos e companhias aéreas.

 

O que não é natural e não é de forma alguma entendível é que alguém que se fez por ser um acérrimo defensor da economia de mercado livre, alguém que se diz um liberal moderno, alguém que afirmava assertivamente categóricas sentenças como que o mercado se devia regular a ele próprio e que o estado devia deixá-lo ser livre, e, neste contexto, detendo já o atual cargo, nunca se opôs à privatização da TAP, venha agora, à primeira decisão estratégica da companhia privatizada, mostrar-se contra.

 

De repente, parece que há uma quantidade de pessoas, inocentes puros ou puros malfeitores, que esperava que a privatização da TAP ia deixar tudo na mesma não beliscando nunca o interesse público nacional e regional. Repetem suspeitamente este mesmo género de atitudes, privatização após privatização, agarrados a cadernos de encargos detalhados, perfeitos libretos de óperas bufas, fazendo crer ao povo que o privado é bondoso e altruísta, que se preocupa muito com tudo e todos e, no fim de contas, ainda produz lucros miraculosos.

 

Quando o conto de fadas se desfaz inevitavelmente, aparecem logo muito indignados: “Como é que isto foi acontecer?!”, perguntam, de olhos arregalados e perdidos e o povo, como sempre, desculpa-os e acolhe-os no seu ombro.

 

Os liberais padecem desta hipocrisia endémica: no que lhes diz estritamente respeito são socialistas.

publicado às 11:28

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