"Exames" são sinónimo de exigência?
A propósito das alterações operadas pelo novo governo no sistema de avaliação dos alunos no ensino básico, tenho lido artigos de opinião tremendos em termos vacuidade. São contribuições absurdas para o debate, sem um pingo de lógica ou de bom senso e parecem estar a ser vertidas descontroladamente por uma torneira reacionária qualquer.
Por ser tão fácil encontrar os artigos aos quais me refiro, vou-me abstrair de colocar nomes neste texto. A tónica geral do discurso é colocada na questão da “exigência”. O novo sistema sem exames não é exigente e a afirmação é apresentada assim mesmo como uma verdade evidente, como uma noção comum dos Elementos de Euclides. Leiam-se os artigos que têm vindo a poluir as entranhas dos jornais ao longo das últimas semanas. Ouçam-se as opiniões emitidas nos debates televisivos.
No último artigo que li, o qual creio não ser o único a advogar tal posição, ensaiava-se uma espécie de argumento segundo o qual a existência de exames torna-se fundamental para impedir a ociosidade e a preguiça dos professores que, segundo a autora, apenas trabalham e preparam os seus alunos se tiverem exames em vista. E é isto! A argumentação sobre a existência ou não de exames, sobre o modelo mais geral para avaliação dos alunos resume-se, no máximo, a argumentos desta natureza que ofendem o brio e o profissionalismo da classe dos professores. Está tudo dito.
Nada disto é anormal, todavia. A nossa sociedade (sobre)vive num clima de permanente suspeita e desconfiança e a classe profissional dos professores, que devia ser entendida como um verdadeiro farol de cultura, pela sua formação e relevância, não é exceção sendo constantemente humilhada com opiniões deste tipo.
Por outro lado, é também normal ver nos outros os defeitos próprios. É normal que a jornalista que escreveu o artigo em causa veja nos professores o laxismo que, eventualmente, reconhece em si própria quando não é controlada. Por ventura, é essa jornalista que, eventualmente, precisa de ser constantemente avaliada e ter os seus chefes sempre à sua perna para desenvolver o seu melhor trabalho e, por isso, julga que os professores devem ser avaliados pelo mesmo referencial.
Existe, contudo, uma questão basilar: em geral, os professores têm cursos superiores e mestrados, formações científicas e pedagógicas sólidas. E mais, a maioria dos professores não está a trabalhar pelo sobrenome ou pela cor dos seus olhos. A maioria dos professores está a trabalhar onde está a trabalhar pelo seu mérito profissional, nota de curso e experiência. Isto que refiro pode parecer uma alucinação nos dias que correm e no país em causa mas é a realidade. E esta realidade faz toda a diferença.
"Exames" são sinónimo de exigência? Os nórdicos são pouco exigentes por estarem a abolir os exames? Os seus professores são preguiçosos? Será que temos que criar exames para os médicos, para os engenheiros e demais profissões para evitarmos a preguiça?
Seria urgente elevar o nível do debate. Seria, se não fosse esta uma estratégia costumeira para não se discutir nada com seriedade e para alimentar mentalidades obscuras.