Máscaras
Há partidos que quando estão na oposição os seus membros tratam-se por “camaradas”, mas quando estão no poder tratam-se por “senhor doutor”, “senhor engenheiro” e “senhor arquiteto”.
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Há partidos que quando estão na oposição os seus membros tratam-se por “camaradas”, mas quando estão no poder tratam-se por “senhor doutor”, “senhor engenheiro” e “senhor arquiteto”.
Basta carregar o vídeo, avançar até ao minuto 13:01, sensivelmente, e ouvir.
E é isto... Fico triste, uma vez mais.
Dediquemos toda a nossa atenção à seguinte declaração do ministro da economia. Saboreemos cada palavra.
“Uma empresa com a importância estratégica da TAP não pode estar refém de 190 pilotos ou de 900 pilotos.”
Algumas perguntas surgem ejetadas após tamanha pancada. Isto é normal?! É admissível?!
O que pensa sobre o direito à greve um indivíduo que produz tal afirmação? O que com ela parece sugerir senão que o direito à greve deve ser limitado e, concretamente, subordinado aos interesses da economia?
Estamos bem, acho. Perdeu-se definitivamente a noção do decoro social, nem que por mera hipocrisia.
Vejamos a coisa pelo lado positivo: a saída do armário é sempre boa, seja por um ato de afirmação sexual, religiosa ou política. E hoje vemos tão claramente... É tudo tão nítido... Aqueles novos democratas expelidos do regime da velha senhora, e que a revolução de abril revelou, mostram a sua verdadeira face e sem necessidade de hipocrisias.
Neste dia vinte e cinco de abril que passou ouvi muitas pessoas dizerem que a revolução dos cravos não foi bem sucedida, que não temos um país melhor e que, por isso, a celebração do dia resulta falsa, pois o insucesso não deve ser celebrado.
Oponho-me vigorosamente a esta linha de pensamento, não obstante compreenda algum do sustentáculo argumentativo. Oponho-me fundamentalmente porque o vinte e cinco de abril de mil novecentos e setenta e quatro fez, e foi muito bem sucedido, em precisamente aquilo a que se propunha fazer, a saber:
O vinte e cinco de abril fez tudo isto e, eventualmente, mais qualquer coisa de que agora não me recordo. Fez muito. Deu de mão beijada ao povo português a possibilidade deste escolher os seus representantes. Por conseguinte, não se assaquem quaisquer responsabilidades ao vinte e cinco de abril que o vinte e cinco de abril não tem.
O plano de propostas do PS é importante não pelo que é mas pelo que representa.
O que é não é mais que um saco de intenções infundadas e por vezes perigosas. A metáfora constitui ilustração suficiente.
O que representa é, estruturalmente, uma ideia de colagem ao plano da troika e da austeridade, a manutenção de um paradigma aqui e ali pontualmente aliviado mas sem se saber efetivamente como.
Não existe, sejamos claros, mudança de paradigma: não há um plano consistente para tornar Portugal num país produtivo. A aposta no consumo interno é importante e fundamental, mas terá que ser sustentada em algo mais que um castelo de areia. É preciso um plano que faça do estado um dínamo capaz de impelir a economia para a exploração dos recursos humanos e materiais do país e para a criação de emprego ao invés do que, pelo contrário, tem sido. É fundamental que o estado o faça, visto o setor privado não assumir esse papel, como aliás era expectável. E sobre isto nada é dito. Sem um tal plano, Portugal continuará a definhar como um país periférico de serviços pouco geradores de capital e pouco influentes na balança comercial. Do mesmo modo, nada se diz de concreto e de relevante relativamente ao estado lastimável e mesmo desumano em que se encontra o mercado de trabalho e as relações laborais. Sem uma inversão drástica das políticas seguidas neste domínio, por muita riqueza que o país gerar ela não será capaz de circular saudavelmente pela sociedade e acumular-se-á, inevitavelmente, nos bolsos da classe patronal.
No mais, persiste um ataque mais ou menos declarado à segurança social e, especula-se, às restantes funções sociais do estado quer por um rompimento declarado da relação de confiança cidadão-estado no que diz respeito às expectativas geradas, quer por uma estruturada aniquilação de receitas que, em boa verdade, constitui uma estratégia já duradoura no tempo.
Entre o PS e o PSD há efetivamente uma diferença: um D.
O PS ainda não disse verdadeiramente nada sobre o que quer que seja. O seu líder com nada se compromete. Limita-se a dançar, bonacheirão, pelas ocorrências do dia-a-dia, na esperança que o poder lhe caia graciosamente no colo, como tem sido norma no Portugal que se seguiu ao vinte e cinco de abril. O povo alterna porque sim. Também não se percebe muito bem porquê, se não porque nutre apreço pela promíscua dança.
Ontem, semearam nos meios de comunicação esta hipotética proposta do PS de criação de um subsídio para os trabalhadores mais pobres, aqueles que, mesmo trabalhando, empobrecem sempre. Semearam para preparar a sociedade, para colher o feedback gerado por tal medida.
Esta hipotética medida merece ser discutida pela sua singular simbologia.
Conceder um subsídio à classe trabalhadora mais pobre constitui uma medida de relevância, não apenas no que à mais elementar justiça social e económica diz respeito, mas também no que concerne o estimular da economia pela via do consumo interno, algo fortemente mutilado nestes anos de depressão e de austeridade.
Levantam-se aqui, contudo, duas questões.
Primeiro, no que à geração dos recursos para dotar esse subsídio diz respeito, prevê-se que o capital seja angariado dos impostos pagos por todos e, portanto, maioritariamente pelos trabalhadores por conta de outrem e individuais. Torna-se claro que este subsídio para os mais pobres tornará os remediados e os menos pobres, a fustigada classe média entenda-se, mais pobre. Esta ideia não parece ser muito animadora... não parece ser justa.
Em segundo lugar, levanta-se uma não menos importante questão de princípio. Se o subsídio é criado para corrigir uma assimetria grave no tecido social, um desequilíbrio grosseiro na distribuição da riqueza produzida, pois então deveria ser obrigatoriamente acompanhado de um pacote de medidas legislativas que visassem a correção estrutural desse desequilíbrio. Sem tais medidas (aumento do salário mínimo, regulação do mercado de trabalho, fim dos falsos recibos verdes, fiscalização efetiva das relações laborais) este subsídio resulta também num prémio para todas as entidades patronais que pagam tais avenças miseráveis, na medida em que torna os seus trabalhadores mais motivados, menos reivindicativos e permite perpetuar o sistema e quiça diminuir ainda um pouco mais as retribuições pagas.
Esta hipotética medida é paradigmática do que não é esquerda, mas do que, não obstante, muitos julgam ser esquerda, visto não promover uma equilibrada distribuição de riqueza. Antes pelo contrário.
Em doze de março do ano corrente sucedeu um acontecimento de assaz interesse e relevância e que deveria ter justificado os comentários dos mais ilustres comentadores que pululam por toda a parte, bem como acesos debates públicos, quer pelo ponto de vista prático da nossa situação concreta atual, quer desde um ponto de vista mais geral, filosófico até.
No dia doze de março de dois mil e quinze decidiu a Islândia, por iniciativa própria, retirar a sua candidatura a membro da União Europeia.
Por que razão o fez?
Esta é a questão que deveria e devia, ainda vai muito a tempo, de ser discutida. Pelo contrário, a notícia passou despercebida no rodapé de um ou outro jornal e ignorada pela generalidade dos media televisivos.
Por mim, deixo aqui a minha contribuição para o debate que nunca teve lugar. A razão é simples: depois de o povo islandês ter aberto o precedente de julgar e condenar os governantes que colocaram a sua economia em bancarrota eminente, estes governantes que os sucederam têm agora algum receio, não vá a coisa dar para o torto, de, daqui por uma ou duas décadas, partilharem as celas dos seus antecessores.
Quando ouço certos intervenientes (chamemos-lhes assim) do jogo político conjugarem, na mesma oração, convergência de forças de esquerda e PS, fico baralhado: serei eu de “esquerda”, afinal?
Quedo-me a meditar por uns minutos sobre o que é ser de esquerda, percebo que sim, que ser de esquerda faz parte de mim e regresso a plenas faculdades mentais.
Então volto a ouvir tamanhas aberrações insistentemente repetidas pelos meios de comunicação, mas já não surtem o mesmo efeito. Soa simplesmente a imbecilidade e a oportunismo.
São horas de propaganda.
Os ministros e secretários de estado deste governo revezam-se em conferências de imprensa nas quais, durante horas a fio, cantam, como bardos da europa antiga, mitos e lendas com as quais adormecem o povo que se acocora em seu redor e ouve, deslumbrado, até adormecer.
Agora, fazem previsões excecionais, apresentam números sem vestígio de antecedente que o justifique, acenam ao povo com um Portugal de ilusões que se concretizará em 2019.
E continuam, estes obscuros bardos, vindos da europa das trevas... E os meios de comunicação transmitem e repetem sem sombra de observação pertinente, sem uma questão inteligente que se escape ao rol de perguntas protocolarmente combinadas.
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