Dois meses mais até à eternidade
Dois meses mais como se de uma unidade de distância e não de tempo se tratasse. São mais dois meses aqueles que um cidadão deve trabalhar para ter acesso à sua reforma, num incremento sem fim, sem que de antemão soubéssemos que a idade da reforma sofre de igual modo a influência da inflação assim como o preço da massa ou do arroz.
Dizem que vivemos muito mais tempo. Por aqui, confesso que os velhos vão morrendo na mesma. Morrem das mesmas doenças e maleitas. São as mesmas que existiam antes do dobrar do milénio, só que agora têm nomes próprios, só seus, quando anteriormente eram confortavelmente acomodadas naquela categoria que a todas abraça: as “doenças da velhice”. Agora têm nomes próprios, conhecemo-las pelos nomes e os médicos perderam a dúvida no olhar no momento do diagnóstico. Chamam-nas pelos nomes de forma categórica. Depois levam os velhos para os edifícios novos e gigantes que hoje existem e submetem-nos a uma série de experiências. São experiências que envolvem químicos luminosos e raios invisíveis mas que queimam a pele. Dizem que são tratamentos que atrasam o chegar da morte. Por vezes abrem-nos. Abrem-nos e fecham-nos. Aos velhos. Quando a coisa perde o interesse, libertam-nos. Deixam-nos vir morrer a suas casas. Chamam-lhe tempo de sobrevida.
Ao ouvir as notícias sobre a segurança social fico feliz. Por momentos sinto que sou eterno. Que superarei um século e não ficarei por aí. Depois, olho em volta. E vejo os velhos a morrer do mesmo modo e à mesma velocidade com que morriam pouco depois de a segurança social ter sido criada. Morrem na mesma, só que agora sabem o nome daquilo que os mata.